
O grande silêncio
Publicado em 10/10/2008 21:00:00 | Tópico: Pablo Neruda
| Todos perguntaram, que aconteceu? Sem perguntar se perguntavam todos e começou-se a viver o veneno sem saber como, da noite pro dia. Deslizava-se no silêncio como se fosse neve negra o pavimento, os famintos ouvidos esperavam sinal e não se ouvia senão um surdo rumor numeroso: eram tantas ausências que se uniam umas com outras como um buraco a outro buraco, e outro, outro e mais outro vão fazendo uma rede, e essa é a pátria: sim, de súbito a pátria foi uma rede, todos foram envoltos no vazio, numa rede sem fios que amarrava os olhos, os ouvidos, mais a boca, e já ninguém sentiu que não tinha com que sentir, a boca não tinha direito a ter uma língua, os olhos não deviam ver a ausência, o coração vivia emparedado.
Eu fui, eu estive, eu toquei as mãos, levantei a taça da cor do rio como pão defendido pelo sangue: à sombra da honradez da humanidade dormi e eram esplêndidas as folhas como se uma árvore só resumisse todos os crescimentos desta terra, e fui, de irmão em irmão, bem recebido com a nobreza nova e verdadeira dos que com suas mãos postas na farinha amassaram o novo pão do mundo.
No entanto ali estava nesse tempo a presença tenaz, uma ferida de sangue e sombra que nos acompanha: o que passou, o silêncio e a pergunta que não se abriu na boca, que morreu na casa, no caminho, pela usina. Alguém faltava, mas não poderia a mãe, o pai, o irmão, e mais a irmã, e olhar o vazio de uma ausência atroz: o olhar do ausente era como um estigma: e não poderia olhar o companheiro ou perguntar, sem converter-se em ar, e passar ao vazio, num de repente, sem que ninguém notasse ou que soubesse.
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