
Afonso de Albuquerque
Publicado em 25/04/2007 22:40:00 | Tópico: Miguel Torga
| Quando esta escrevo a Vossa Alteza Estou com um soluço que é sinal de morte. Morro à vista de Goa, a fortaleza Que deixo à índia a defender-lhe a sorte.
Morro de mal com todos que servi, Porque eu servi o rei e o povo todo. Morro quase sem mancha, que não vi Alma sem mancha à tona deste lodo. De Oeste a Leste a índia fica vossa; De Oeste a Leste o vento da traição Sopra com força para que não possa O rei de Portugal tê-la na mão.
Em Deus e em mim o império tem raízes Que nem um furacão pode arrancar... Em Deus e em mim, que temos cicatrizes Da mesma lança que nos fez lutar.
Em mais alguém, Senhor, em mais ninguém O meu sonho cresceu e avassalou A semente daninha que de além A tua mão, Senhor, lhe semeou.
Por isso a índia há de acabar em fumo Nesses doiros paços de Lisboa; Por isso a pátria há de perder o rumo Das muralhas de Goa.
Por isso o Nilo há de correr no Egito E Meca há de guardar o muçulmano Corpo dum moiro que gerou meu grito De cristão lusitano.
Por isso melhor é que chegue a hora E outra vida comece neste fim... Do que fiz não cuido agora: A índia inteira falará por mim.
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