
A Tua Roca
Publicado em 28/02/2012 22:50:51 | Tópico: Outros Autores
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Quando te vejo à noitinha Nessa cadeira sentada, Xaile cruzado no peito, Na cinta a roca enfeitada.
Os olhos postos na estriga, Volvendo o fuso nos dedos, Os lábios contando ao fio Da tua boca segredos.
Eu digo, sem que tu oiças, Pondo os olhos na tua roca: Se eu um dia fosse estriga, Beijaria aquela boca!
Que eu nunca te vi fiando Sem invejar os desvelos Com que desfias do linho Os brancos, finos cabelos!
E aquela fita de seda Com que enleias o fiado, Irmã do lencinho verde Que trazes no penteado?
Parece aquilo um abraço De um amor que é todo nosso, A trança do teu cabelo Em volta do meu pescoço!
É por isso que eu murmuro Vendo a fita que se enreda: Quem me dera ser a estriga, E ela a fitinha de seda!
Eu já sei o que sinto, Se tristeza, se ventura, Mal que suspendes a roca Da tua breve cintura!
Penso que fias nos dedos Os dias da minha vida, Ao pé de ti sempre curta, Ao longe sempre comprida!
Pareces-me um ramalhete Sentada nessa cadeira, E a fita da tua roca A silva de uma roseira.
Meu amor, quando acabares De espiar a tua estriga E ouvires por alta noite Soluçar uma cantiga,
Sou eu que estou a lembrar-me Da tua divina boca, E penso que em mim são dados Os beijos que dás na roca!
Peninsulares - José Simões Dias (1844-1899)
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