
Portugal, Sacro-Profano Lugar Onde
Publicado em 03/07/2011 20:40:04 | Tópico: Ruy Belo
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Neste país sem olhos e sem boca hábito dos rios castanheiros costumados país palavra húmida e translúcida palavra tensa e densa com certa espessura (pátria de palavra apenas tem a superfície) os comboios são mansos têm dorsos alvos engolem povoados limpamente tiram gente de aqui e põem-na ali retalham os campos congregam-se dividem-se nas várias direcções e os homens dão-lhes boas digestões; cordeiros de metal ou talvez grilos que mãe aperta ao peito os filhos ao ouvi-los? Neste país do espaço raso do silêncio e solidão solidão da vidraça solidão da chuva país natal dos barcos e do mar do preto como cor profissional dos templos onde a devoção se multiplica em luzes do natal que há no mar da póvoa do varzim país do sino objecto inútil única coisa a mais sobre estes dias Aqui é que eu coisa feita de dias única razão vou polindo o poema sensação de segurança com a saúde de um grito ao sol combalido tirito imito a dor de se poder estar só e haver casas cuidados mastigados coisas sérias o bafo sobre o aço como o vento na água País poema homem matéria para mais esquecimento do fundo deste dia solitário e triste após as sucessivas quebras de calor antes da morte pequenina celular e muito pessoal natural como descer da camioneta ao fim da rua neste país sem olhos e sem boca
“Homem de Palavra(s)” Editorial Presença, 1978 (reedição)
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