
Evolução
Publicado em 09/11/2010 22:50:08 | Tópico: Guerra Junqueiro
| Evolução
Arde o corpo do sol, brotam feixes de luz: O que é a luz? Sol que morreu.
Dardeja a luz, dardeja e pulveriza a fraga: Vai nesse pó, que há-de ser terra, A luz extinta.
Gerou a terra a seara verde: Hastes e folhas da seara verde Comeram terra.
A seara é grada, o trigo é loiro: Deu trigo loiro, Morrendo ela.
O trigo é pão, é carne e é sangue: Sangue vermelho, carne vermelha, Trigo defunto.
Em carne e em sangue, eis o desejo: Vive o desejo, De carne morta.
Arde o desejo, eis o pecado: Que são pecados? Desejos mortos.
Queima o pecado o pecador: Nasceu a dor; findou na dor Pecado e morte.
A alma branca, iluminada, Transfigurada pela dor, Essa não vai à sepultura Porque é já Deus na criatura, Porque é o Espírito, é o Amor.
Na vida vã da terra sepulcral Só o amor é infinito e só ele é imortal.
Morreu a luz, pulverizando a fraga, Morreu a poeira, alimentando a seara; Morreu a seara, que gerou o trigo; Morreu o trigo, que deu vida à carne; Morreu a carne, que nutriu desejo; Morreu desejo, que se fez pecado; Morreu pecado, que floriu em dor; Morreu a dor, para nascer o Amor!
E só o Amor na vida sepulcral É infinito e é imortal!
Guerra Junqueiro, in 'Poesias Dispersas'
|
|