Mário Lago : Vida e Obra
em 09/10/2011 15:09:07 (6315 leituras)
Mário Lago

Mário Lago.

Ele nasceu na histórica Rua do Resende, no Rio de Janeiro, em 26 de novembro de 1911, filho único de Antônio Lago, um jovem compositor, maestro e violinista de sucesso, de uma família de músicos; e de Francisca Maria Vicência Croccia Lago, jovem descendente de calabreses, oriunda também de família de músicos.

Mário Lago foi criado no bairro da Lapa, no Rio. Formou-se em Direito, mas jamais exerceu a profissão. Chegou a trabalhar como jornalista e estatístico, mas por pouco tempo. Desde criança, a arte exerceu absoluto fascínio sobre ele; uma atração igualada apenas pela política, pela boemia e pela família. A todas elas se dedicou com igual empenho e paixão.

Falecido em 30 de maio de 2002, Mario Lago foi casado por quase 50 anos com Zeli Cordeiro Lago. O ator deixou cinco filhos (Vanda, Antonio Henrique, Graça, Luiz Carlos – falecido em 2010 – e Mário).


Breve currículo

Autor - A estréia de Mário Lago aconteceu em março de 33, como autor teatral. A maior parte de suas peças foi escrita nas décadas de 40 e de 50, para o chamado Teatro de Revista e para atores como Araci Côrtes, Elza Gomes, André Villon, Oscarito e Armando Nascimento. No início dos anos 1970, escreveu a sua última peça teatral: "Foru Quatro Tiradentes na Conjuração Baiana", sobre a Revolução dos Alfaiates, na Bahia. Proibida pela Censura, teve uma única leitura pública, com participação do próprio Mário, ao lado dos atores Oswaldo Loureiro, Wanda Lacerda, Francisco Milani e Milton Gonçalves, entre outros.

Também escreveu roteiros e argumentos para o cinema, entre eles, o do filme Banana da Terra (1939), em parceria com João de Barro, o Braguinha.

Compositor - Na música, estreou em 1936, com a marchinha Menina, eu sei de uma coisa, primeira parceria com Custódio Mesquita. O sucesso viria dois anos depois, com Nada além, da mesma dupla, na gravação de Orlando Silva. Sozinho, ou em parceria com nomes como Ataulfo Alves, Chocolate, Roberto Roberti, Roberto Martins, Benedito Lacerda, Elton Medeiros e João Nogueira, Mário compôs sucessos como Amélia, Atire a primeira pedra, Aurora, Dá-me tuas mãos, Enquanto houver saudade, Fracasso, Será e Número um.

Ator - Em 1942, estreou como ator de teatro, onde criou personagens de grande repercussão, como o Aprígio, no clássico O Beijo no asfalto, de Nélson Rodrigues. No cinema, atuou em alguns dos principais filmes brasileiros, como O Padre e a Moça, de Joaquim Pedro de Andrade, Os Herdeiros, de Cacá Diegues, O Bravo guerreiro, de Gustavo Dahl, e Terra em transe, de Glauber Rocha.

A popularização do ator veio com as novelas, a partir de 1966, destacando-se suas atuações em O Casarão, de Lauro César Muniz, Nina, de Walter George Durst, e Dancing Days, de Gilberto Braga, trabalhos que lhe renderam dois prêmios de Melhor Ator da Associação Paulista de Críticos de Artes e um Golfinho de Ouro.

Seus últimos papéis na TV foram a minissérie Hilda Furacão (1998), de Glória Perez, interpretando o velho boêmio Olavo; o especial Enquanto a Noite não Chega, em dezembro de 2000, e uma participação especial na novela O Clone, de Glória Perez, revivendo o personagem Dr. Molina, de Barriga de Aluguel, da mesma autora. Mário Lago gravou a novela no final de 2001, seis meses antes de falecer.

Radialista - No rádio, foi ator, autor de novelas, produtor e diretor. Seu trabalho mais conhecido foi a série Presídio de Mulheres, que escreveu para a Rádio Nacional e que liderou a audiência da emissora durante cinco anos seguidos. Em 1964, com o golpe militar, Mário Lago foi demitido da Nacional.

Escritor – Autor de 11 livros, Mário estreou com a coletânea de poemas políticos O Povo Escreve a História nas Paredes. Poeta e escritor - Sua produção literária inclui os títulos Chico Nunes das Alagoas, Na Rolança do Tempo, Bagaço de Beira Estrada, Rabo da Noite, Meia Porção de Sarapatel, Manuscrito do Heróico Empregadinho de Bordel, Segredos de Família e o infantil Monstrinho Medonhento, seu maior sucesso editorial. Deixou um livro inconcluso, dedicado às memórias das boas “molecagens” que praticou ao longo da vida.



Militância - Desde jovem, Mário se dividiria entre o trabalho artístico, uma intensa atividade política e a boemia. A participação política lhe rendeu seis prisões, a primeira em janeiro de 1932, e a demissão da Rádio Nacional, em 1964, o que resultou em quase um ano de desemprego. Na época do golpe militar, era procurador do Sindicato dos Radialistas do Rio de Janeiro, um dos mais combativos do país.

Mário participou de várias campanhas em defesa dos direitos humanos e do patrimônio do país, como O Petróleo é Nosso, Contra as Armas Nucleares, Campanha da Paz (durante a II Guerra), Anistia (décadas de 40 e 70), Contra a Censura, Diretas Já, Pela Condenação dos Assassinos de Chico Mendes etc. No século XX, não há registro de movimento político do gênero que não tenha tido o apoio e a participação direta de Mário Lago. Curiosamente, jamais foi filiado a qualquer partido. A partir de 1989, passou a dar apoio e militância ao PT, mas sem vínculo de filiação.

Cronologia:

26/ 11/ 1911 – Mário Lago nasce, na Rua do Resende, no Rio, filho do maestro e violinista Antônio Lago e de Francisca Maria Vicencia Croccia Lago.

1918 – É internado na Santa Casa, como uma das primeiras vítimas no Brasil da gripe espanhola. Começa a estudar piano com Lucila Villa-Lobos, mulher do maestro Heitor Villa-Lobos.

1920 – Iniciado o desmonte do Morro do Castelo, local que se destinaria às exposições do 1º Centenário da Independência do Brasil e à Exposição Internacional. Mário acompanha toda a obra levado pelo avô, o anarquista Giuseppe Croccia, defensor de ideias desenvolvimentistas.

1923 – Entra para o Colégio Pedro II, tradicional colégio carioca, que, naquele mesmo ano admitiu, pela primeira vez, a presença de mulheres: a professora Maria da Glória Moss, de Física, e uma aluna. Mário lidera uma greve de estudantes contra o uso obrigatório de canecas; é o começo de sua militância política.

1924 – Desiste do piano, pois o estudo lhe exige muita disciplina.

1926 – Publica seu primeiro poema, "Revelação", na revista "Fon-Fon". Começa a trabalhar no jornal "O Radical".

1930 – Entra para a faculdade de Direito da Universidade do Brasil, onde conhece a filosofia comunista. Integra o Socorro Vermelho, grupo que presta assistência a presos políticos.

1932 – Em 21 de janeiro, já na Juventude Comunista, é preso pela primeira vez. Após um comício na porta da fábrica de tecidos Mavilis, da América Fabril. Adota o codinome de Pádua Correia, uma homenagem ao nome com o qual sua mãe queria batizá-lo – Mário de Pádua Jovita Correia do Lago – e que acabou encurtado para Mário Lago, por decisão pai. Ao ser solto, é conduzido por policiais até a fronteira com o Uruguai e ameaçado de morte. Passa dois meses como clandestino no Uruguai, e retorna ao Brasil.
Na volta ao Brasil, entra para o Cordão da Bola Preta, um dos mais populares do Rio. Mário carregava a flâmula da Bola, para o qual fez o hino "Braço é braço", em parceria com Nelson Barbosa.

1933 – Em fevereiro, estreia como autor de Teatro de Revista, com a peça "Flores à Cunha", um sucesso imediato.
Termina a faculdade de Direito e estagia em um escritório de advogados por três meses; desiste da profissão.

1935 – Estreia como compositor com a marcha de Carnaval "Menina, Eu Sei de Uma Coisa", primeira parceria com Custódio Mesquita. A música é gravada por Mário Reis, no ano seguinte.

1936 – Mário e Custódio escrevem a peça "Sambista da Cinelândia", que alcança 200 apresentações. Lago trabalha como redator-chefe do Departamento de Estatística do Estado do Rio de Janeiro Chega a ser nomeado membro do Conselho do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mas não toma posse.

1938 – A música "Nada Além", parceria com Custódio Mesquita, torna-se sucesso na voz de Orlando Silva.

1939 – Escreve, em parceria com o compositor e amigo João de Barro, o Braguinha, argumento e roteiro do filme "Banana da Terra", no qual Carmem Miranda reinventa o traje de baiana e canta "O que é que a baiana tem?", do até então desconhecido Dorival Caymmi. O sucesso é tão grande que Carmem adota a baiana estilizada e, meses depois, segue para Hollywood.

1940 – Uma de suas mais famosas composições, em parceria com Roberto Roberti, "Aurora" é gravada pela dupla Joel e Gaúcho. A música tem repercussão internacional na interpretação de Carmem Miranda. O filme Segure o Fantasma (Hold that ghost), da dupla Abbot & Costello, inclui versão em inglês da marchinha apresentada pelas Andrew Sisters.

1942 – O diretor teatral Joracy Camargo convida Lago a subir ao palco no lugar do galã principal da peça "O Sábio". Assim, por acaso, Mário Lago torna-se ator.
Compõe, em parceria com Ataulfo Alves, o samba "Ai, que Saudade da Amélia", um dos maiores sucessos da música brasileira. Amélia acaba virando verbete de dicionário, sinônimo de mulher submissa, uma interpretação rechaçada pelo autor, que considerava a personagem muito mais como um sinônimo de solidariedade.

1944 – Entra para o rádio, a convite de Oduvaldo Vianna. Trabalha como autor, ator, diretor e apresentador na recém-criada Radio Pan-Americana, de São Paulo.

1945 – Volta ao Rio e é contratado pela Rádio Nacional.

1947 – Em 23 de março, conhece Zeli Cordeiro, filha do dirigente comunista Henrique Cordeiro, em um comício do Partido Comunista no Largo da Carioca, no Rio. Em novembro, os dois se casam.
Estreia como ator de cinema no filme "Asas do Brasil", de Raul Roulien.
A música "Atire a Primeira Pedra", parceria com Ataulfo Alves, é gravada e faz enorme sucesso.

1948 – Por questões políticas, é demitido pela primeira vez da Rádio Nacional. Começa a trabalhar na rádio Mayrink Veiga.
Publica o primeiro livro - "O povo escreve a história nas paredes" -, de poemas políticos, que reforça a campanha "O nosso petróleo é nosso" (mais tarde, a palavra de ordem seria resumida para "O petróleo é nosso").
Nasce o primeiro filho, Antonio Henrique.

1949 – É preso na redação do jornal clandestino "A Classe Operária" e afastado da rádio Mayrink Veiga. Em julho, começa a trabalhar na rádio Bandeirantes, em São Paulo, a convite de Dias Gomes.

1950 – Com o PCB na ilegalidade, é candidato a deputado estadual pelo PST (Partido Social Trabalhista) paulista, como candidato de Luiz Carlos Prestes. Durante a campanha, faz um discurso inflamado, no qual chama o governador de São Paulo, Ademar de Barros, de calhorda. Acaba demitido, pois Ademar é dono da rádio Bandeirantes. Volta ao Rio e à Rádio Nacional.

1951 – Ao lado de Paulo Gracindo, é um dos narradores da famosa novela cubana "O Direito de Nascer". Começa a escrever o seriado "Presídio de Mulheres", que vai ao ar diariamente, durante cinco anos.

1954 – Estreia como ator de TV no programa "Câmera Um", na TV Rio. Na emissora, atua ainda no Teatro Moinho de Ouro. Mais tarde, participa do elenco do Grande Teatro Tupi.

1962 – Integra a diretoria do Sindicato dos Radialistas do Rio de Janeiro, um dos mais combativos à época.

1964 – Em abril, é preso em sua casa, em Copacabana, no Rio, pelo Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e levado para a ilha das Flores. É transferido para o presídio Fernandes Viana, na Frei Caneca, e fica preso por 58 dias. É demitido da Rádio Nacional pelo Ato Institucional n° 1, junto com mais 35 colegas da emissora. Passa por situação financeira difícil. Para sustentar a família, começa a trabalhar em fotonovelas.

1966 – Estreia como ator na TV Globo, vivendo um coronel nazista, na novela "O Sheik de Agadir", da cubana Gloria Magadan. Anticomunista ferrenha, a autora tentou vetar o nome de Mário. Foi derrotada pela insistência do diretor da novela, Henrique Martins, e do diretor da emissora, Walter Clark.
Trabalha no filme "O Padre e a Moça", de Joaquim Pedro, abrindo uma sequência de atuações marcantes no cinema.

1967 – Faz o papel de um oficial do Exército no filme "Terra em Transe", de Glauber Rocha.

1968 – Adapta, para a TV Tupi de São Paulo, o seriado "Presídio de Mulheres".
Atua no filme "Bravo Guerreiro", de Gustavo Dahl, e na peça "Os Inconfidentes", que tem direção de Flávio Rangel, poesia de Cecília Meireles e música de Chico Buarque.
No dia 14 de dezembro, um dia após a edição do AI-5, é preso antes de entrar em cena, na peça "Inspetor, Venha Comigo". É libertado no dia 31 de dezembro.

1969 – Em 25 de fevereiro, é preso por ter feito a tradução de um livro sobre a Guerra do Vietnã. Volta à prisão meses depois, quando da visita do senador norte-americano Nelson Rockfeller ao Brasil.

1973 – Atua no filme "São Bernardo", de Leon Hirszman.

1974 – Escreve a peça "Foru Quatro Tiradente na Conjuração Mineira", que é proibida pela Censura.

1975 – Intensifica a sua produção como memorialista. Publica a obra de pesquisa folclórica "Chico Nunes das Alagoas".

1976 – Por sua atuação como o personagem Atílio, na novela "O Casarão", de Lauro César Muniz, recebe o prêmio de melhor ator pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA).
Publica o livro autobiográfico "Na rolança do tempo". Inventada por Mário, a palavra rolança também vira verbete de dicionário.

1977 – Lança o livro "Bagaço de Beira-Estrada", sequência de "Na rolança ...".
Com o personagem Antônio Galba, na novela "Nina", de Walter George Durst, recebe o prêmio de melhor ator da Associação Paulista de Críticos de Arte.

1978 – Participa da novela "Dancing Days", de Gilberto Braga. Sua atuação como Alberico lhe rende o Golfinho de Ouro, prêmio do Museu da Imagem e do Som (MIS).
Volta aos palcos, contando casos e histórias, em um espetáculo ao lado do compositor João Nogueira.

1980 – Mário Lago e 35 companheiros são anistiados (alguns "in memorian") e reintegrados à Rádio Nacional.

1984 – Escreve o livro infantil "O Monstrinho Medonhento", seu maior sucesso editorial.

1989 – No segundo turno da campanha para a Presidência da República, declara apoio a Luiz Inácio Lula da Silva e passa a militar no PT.

1991 – Para comemorar seus 80 anos, cria e protagoniza o show "Mário Lago - Causos e canções", dirigido pelo filho caçula e xará Mário Lago Filho. Por quase dez anos, percorreu inúmeras cidades brasileiras. Nas homenagens, é lançado o disco "Nada Além"; recebe o título de Cidadão Benemérito do Rio de Janeiro, e lança o livro "Segredos de família", uma coletânea de poesias, crônicas e fotografias dele e dos filhos.
Volta a compor – sozinho ou em parcerias com o filho, com João Nogueira e com Elton Medeiros.

1997 – Em 10 de junho, quatro meses antes de completarem 50 anos de casamento, morre a sua mulher, Zeli.

2000 – Em dezembro, participa do especial de TV "Enquanto a noite não vem", conto de Josué Guimarães, adaptado por Emanuel Carneiro. Sai do hospital direto para o estúdio, acompanhado de seu médico, Léo Benjamin.

2001 – Em novembro, grava uma participação especial na novela "O clone", revivendo o personagem Dr. Molina, da novela "Barriga de aluguel", da mesma autora, Gloria Perez.
Em 26 de novembro, a Rua Júlio de Castilho, em Copacabana, é fechada para homenagear o seu morador mais ilustre nos seus 90 anos. Lago diz estar "torcendo para chegar aos 100 anos". O então candidato Luiz Inácio Lula da Silva interrompe a campanha para participar das homenagens ao amigo e companheiro.

2002 – Em 16 de janeiro, recebe em sua casa, das mãos do então presidente da Câmara dos Deputados, Aécio Neves, a medalha do Mérito Legislativo. Uma delegação pluripartidária participa da cerimônia.

30 de maio de 2002 – No início da noite, Mário Lago morre em casa, como queria, junto dos filhos e netos, depois de três meses de internação domiciliar. Foi velado no Teatro João Caetano, onde estreou como autor, numa despedida regada a samba e cerveja, de acordo com a antiga tradição da boemia.

"Fiz um acordo de coexistência pacífica com o tempo; nem ele me persegue, nem eu fujo dele. Um dia, a gente se encontra".

*Fonte: http://www.mariolago.com.br


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