
Aurora Precoce
Data 29/08/2009 19:16:28 | Tópico: Poemas
| Dizem que o dia nasce tal hora Em hora certa de relógio Dizem que o dia nasce a cada dia em hora um pouco diversa da do dia anterior e da do posterior.
Se o sol nunca pisca E a nua nunca deixa de valsar Se o amor nunca cresce porquê é infinito por natureza E minha vida nunca acaba porquê é fluxo e refluxo de qualquer referência ignóbil e parcial do infinito O dia nasce quando eu bem entenda.
A mim ao menos O dia nasce quando eu bem compreenda Quando eu bem aceite que o dia nunca acaba Ou que apenas começa e acaba fora desta ínfima parcela do tudo a que chamo meu ser.
Assim sendo tão comprimida esta transitoriedade de meu estado Sendo tão óbvia a inevitabilidade de meu fim abrupto mui imaginavelmente prévio à treva suprema do existir Assim Deus o queira ao menos! Me faz feliz aceitar minha insólita e patética presença eletrostática como o convolucionar duma eternidade autoconstituinte.
E o mal que me fará tal ilusão Toda funesta angústia que um dia certamente há de contrapor este meu Sim a um tal absurdo enganar-me Caso eu não morra num átimo atropelado e livre de reflexão aturdida e descompassada Deus queira que minha morte venha como susto inconsciente! O mal que me fará a certeza do infinito de meu desenrolar Há-de ser um excesso de força e fadiga.
Há-de ser um arrepio estúpido kundaliní acima Demarcando a fronteira entre minha verdade nua e crua e a alegria de minha fantasia tão mundana Há-de ser um amor supremo Uma ânsia de proliferação duma cultura soberba Para poucos A ganância de transmissão duma herança de ignorância complacente e loucamente satisfeita de si Satisfação alienada vivendo um mar de cores e sabores em cada irrelevância.
Há-de ser uma ponte a um futuro imprevisto Uma vitória sobre minha imaginação supérflua Minha ilusão há-de resgatar-me sempre da desilusão com outra maré de insolente abundância de presunções.
Que os ângulos retos do templo que é meu corpo sejam a honra que concedo a meus filhos Deus queira que haja filhos paridos de ventres ímpios dotados da agudeza desta minha falha de caráter Este supremo sim a uma impossibilidade Este imenso abraço em que o cosmos todo me aquece com sua incontinente indiferença.
Ao menos valsarei sempre como folha despregada do galho em meio a vendaval furioso Ao menos meu ósculo será sempre uma entrega da volúpia toda de meu silêncio inefável Ao menos minhas amizades serão sempre o campo de guerra em que apenas o mais forte de mim pode prevalecer Em que somente o imbatível de mim restará após a carnificina da conquista.
E me vem uma revelação Que nada tem de mística nem de instantânea Uma chance de prestar bem atenção no fluxo de meu inspirar-expirar Uma chance de criar uma cultura que constrói novos degraus na escadaria por onde tão inesperadamente escalei ao cume de minha mais alta esperança.
E terá fim tal escalada? Haverá uma América ainda secreta Além Além dos desencontros dos vôos mais longínquos?
Sim Além do esgotamento impostergável de minha nau Voarão ainda outras aves mais longe E não preciso de outra certeza.
Pois se pinto os céus com minha ode desvairada Se marco no horizonte com fumaças liláses esta mensagem de solidão Se mergulho no oblivion deixando fincada bandeira de sucesso sobre mim mesmo Se abandono esta minha ínfima infinitude na certeza de que outras aves perceberão tal distância e se projetarão esfaimadas de travessias para além de minhas conquistas Não preciso de outra certeza. 28 de Março de 2008, São Paulo. http://orgasmagia.blogspot.com/
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