
Visão... ficção?
Data 03/01/2009 23:01:19 | Tópico: Poemas -> Surrealistas
| Subo rapidamente as escadas Em fuga do pesadelo da perseguição Que nunca mais acaba, E sempre que acaba Termina na sala fechada. A porta é de metal e é verde, E fecha-se em pânico.
O desfecho é sempre o mesmo.
No entanto, anos e anos passam E os pesadelos se ultrapassam Com um novo caminho.
Desta vez encontrei saída.
Subi em direcção à luz. Havia luz, muita luz, muita gente. A chuva caía, muita coisa se via, Muita gente sorria.
Vejo um sorriso para mim, Sorriso banal, Tensão sexual, Tentação carnal Que vira meus olhos Para o horizonte.
Não é para isso que aqui estou. Sei de onde vim e para onde vou, Vou até onde a rua me levar, Sei onde a rua vai acabar.
Passei pela igreja e pela rua da renovação, Ignorei a mensagem que não passa de má intenção, Segui porque sabia onde queria ir.
Cheguei ao largo que era a meta, Cheguei ao sítio da magia Que me leva no braço E nem sabia o que eu sentia Nem o que aqui faço.
A mente tratou de tudo mudar. Na casa da frescura residia agora A história de uma vida de penar, As figuras que odiei e aprendi a amar, Tudo o que alguma vez vi ou deixei de ver.
Convite não havia mas a porta estava aberta. Entrei na casa em que havia tudo, Vasculhei com sorriso mudo O que não encontrei antes de aqui chegar.
Vi no entanto a pessoa feliz Em prados de amor e felicidade E falei com ela sem lhe dizer Que nunca a quis perder.
Mas algo estava errado. Estava frente a frente com o fado Que nunca tive mas desejei, E só queria olhar para a esquerda.
Esquerda onde estava a porta Que não tinha porta Mas espaço aberto e luz Para quem quer entrar.
Eu só queria sair. Não queria partir Sem antes dizer adeus, Mas chovia tanto E deixei de rezar a Deus Para viver naquele canto.
Lá fora chovia e chovia mais. A água corria pela rua, Era água minha e tua E estavas lá longe.
Estavas muito longe, A correr em direcção a mim, Nunca te vi assim, Nunca me senti assim, Tirei o casaco em urgência De te ajudar.
A casa estava linda antes de eu sair. Soava a música, cheirava a perfume, Não havia lareira mas havia lume De dias que passaram, Vidas que se interceptaram.
Mas não quis ficar. Eu só queria ajudar.
Corri e corri com o casaco na mão, Só queria oferecer protecção, Não sei bem a quem, Pois ao correr não parava de sentir A minha vida a fugir Para outro lugar e outro alguém.
E chovia mais e mais, E o vulto que eu ia proteger Desapareceu na porta distante.
Subitamente, parou de chover. Lentamente deixei de ver Tudo o que antes lá estava. Procurei proteger E acabei por me perder.
Voltei para trás à procura de abrigo. Tudo estava mais pequeno. A casa acolhedora era agora Um labirinto que outrora Me abrigou folgadamente.
De certeza que me perdia se lá entrasse. Era um sítio com menos brilho, Menos classe e num impasse Entre um beco sem saída E uma hipótese de uma nova vida.
A nova vida ficou-se na chuva. Eu via mais na chuva que ao sol. Eu era mais feliz a correr de casaco na mão Que naquela casa a ver passar o serão. Eu era mais feliz a ver-te correr Mesmo se o teu futuro for desaparecer.
A casa ainda tinha lá gente, E não fiquei feliz com o que vi. Pouco ou nada senti Na casa que deixou de fazer sentido.
A pessoa feliz ainda lá estava, Com prazer se entregava nos meus braços Mas entregar-me a ela não fazia sentido.
Quero chuva. Quero frio. Quero correr à chuva naquela rua. Viver naquela casa deixou de fazer sentido.
E dias e dias passaram, E agora desço escadas Em perseguição que nunca mais acaba, À procura de portas e janelas para sair.
Só quero voltar a ver aquela rua… É mais real do que podia imaginar, Só é preciso esperar Por melhores dias… Só é preciso ficar a ver E encontrar alguém para proteger…
Sei quem é o vulto que à chuva corria. Sei onde estava. Agora visto o casaco numa correria Pois sei onde estou.
|
|