
Estrangeiro
Data 23/07/2008 19:12:51 | Tópico: Poemas
| Sou estranho nesta terra. Estranho? E por que sou? É que longe, aquém das serras, a alma me abandonou...
Estrangeiro sou e não ardo. Meu corpo segue em névoa calma. Não carrego nenhum fardo: não sofre quem não tem alma.
Piso as pedras do caminho livre, só, sem rumo certo. E por ser assim _ sozinho _ nada é longe, nada é perto...
Estou aqui, além, aquém, não importa meu destino; se não me espera ninguém, meu viver é peregrino.
Sou estranho nesta terra. Estranho? E por que sou? É que longe, aquém das serras, a alma me abandonou...
Ser estranho é ser feliz, é ter tudo e não ter nada, ser mestre e aprendiz, tendo a casa na estrada.
Vai, alma, não voltes mais! Vê se te aportas noutro porto. Ser assim muito me apraz: não ser vivo nem ser morto...
Se meu corpo não tem alma, minha'alma um corpo não tem. Tal estado hoje me acalma; a ela não sei se convém.
Sou estranho nesta terra. Estranho? E por que sou? É que longe, aquém das serras, a alma me abandonou...
Sou meio-termo inteiro, animal de consciência; sou ar puro e passageiro, que de si não dá ciência.
Minha'alma foi carcereira do corpo, as rédeas tomava. Fingia ser companheira enquanto só regras ditava.
Perdi amor e felicidade, que a ela não interessava. Hoje há paz e não saudade da alma que o corpo matava.
Sou estranho nesta terra. Estranho? E por que sou? é que longe, aquém das serras, alma me abandonou...
Desalmado sou, bem sei, estou solto e desgarrado, livre do mundo, da lei, sem presente e sem passado.
Minha'alma já foi bem tarde se perder por outros lados. Faço tudo sem alarde: sem alma não há pecado.
Vai, alma, pedir pousada em corpo que te receba. Sou feliz e não me agrada te encontrar pelas veredas.
Sou estranho nesta terra. Estranho? E por que sou? É que longe, aquém das serras, a alma me abandonou...
É bom que eu seja assim, como nuvem passageira... Que o mundo não saiba de mim. Sou quem não fede nem cheira.
Fui louco, tolo, bastardo, a alma de mim fez desdém. Leitores, compreendam meu fado: a alma jamais fez-me bem.
Serei o que queiram que eu seja. Se quiserem, serei ninguém. Sou o novo que viceja do que já foi velho. Amém!
Sou estranho nesta terra. Estranho? E por que sou? É que longe, aquém das serras, a alma me abandonou...
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