
MUITO ALÉM DA MÁSCARA DA NOITE
Data 06/06/2008 11:23:59 | Tópico: Poemas -> Reflexão
| MUITO ALÉM DA MÁSCARA DA NOITE
Será que entregar-me-á ao vazio O pensamento em tormentos naufragado? Ah, mais que besteira que me emana da boca: Na verdade, já o fui e não sei. Ah, quem sabe, Eu talvez não saiba, não queira. Ou, com efeito, eu não goste, não possa ou não procure saber.
A verdade é que, caso a noite assim o quisesse, Entregar-me-ia imediata e integralmente. Não, sinceramente eu digo: Se ainda houver tempo hábil e ela manifeste o anelo por tal senda, Eu o faço de bom grado e tenho o dito. Afinal, desta faço a minha Eterna sentença. Sim, estou farto de lutar contra o obscuro e ferino Mar meu. Sim, não quero mais me digladiar com a hoste De demônios e fantasmas que me circundam e orbitam A mentosfera. Afinal, se a dama do diário toldamento quiser, irrefletidamente, Me lanço, me entrego, sucumbo de corpo e alma a ela. Sim, se Ela quiser, o faço gratamente. O faço verdadeiramente de maneira Congênita. Sim, de bom grado, assumo o provável amargo peso Das consequências.
No entanto, a noite, como boa sádica que seja, Prefere o êxtase da ressonância do padecimento Ao hasteamento da branca bandeira: bandeira Que gosta de dar beijo na face do firmamento. Sim, porque, talvez, tal ação possa confirmar que esta a derrota Esteja reconhecendo. Não, a noite quer ver o espetáculo, o circo, O fogo do masoquismo consumindo, carbonizando-lhe Os êmulos ainda vivos. Sim, enfim, ela quer ver o triúnfo que jaz No eco do meu estertorar vívido.
Não, a noite não me quer domado por um espírito derrotista. Não, a noite não me quer sorumbático e pelas esquinas, bodegas Do desamparo a reclamar da vida que até aqui trago por sina. Não, a noite quer-me impávido e aguerrido. A noite quer-me indômito e bem garrido. A noite quer-me rijo, Embora esteja a carregar chagas langorosas de um ser combalido. A noite quer-me assaltante destemido. Quer que a dor me torne Íntegro. A noite quer-me seda, breu, farol, lúgubre destino. Sim, a noite quer-me á semelhança da rigidez de um morto, Mas lépido como coelho ladino, aceso e furtivo. Ah, a noite, A noite quer-me rameira, ébrio, egoísmo, melancolia: Lufada fria na fronte do miserando mendigo roçando. Cabaço pueril, pai e mãe devassos, puteiro em estrondo: Choro de recém-nascido a sair da boceta duma adolescente de dor Gritando. Sim, sou inverno nefando, primavera, verão, outono: A alba, o ocaso, o céu negro a açambarcar-se soberano: A pairar sobre a cidade que abriga O porto da Baía de todos os Santos!
JESSÉ BARBOSA DE OLIVEIRA
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