
COMEDORES DE SOBRAS
Data 24/05/2008 12:32:07 | Tópico: Poemas -> Sociais
| COMEDORES DE SOBRAS
No penúltimo halo da antemanhã, Pessoas saem de seu humilde viveiro Para buscar o combustível do corpo Em um quase longínquo desterro.
E, ao chegar a seu destino, A feira, Esperam pacientemente O ocaso da efervescência Da harmonia desarmônica Dos sóis de quem vende e de quem compra.
Então, quando advém a hora ansiada, Afluem sôfregas ao encontro do tapete De frutas, legumes e verduras Que cobre o chão Onde, sob os afagos rudes do dia-a-dia, Rodas, sapatos, pés desnudos ou de sandálias Apressada e inescrupulosamente pisam.
Ah, e como a fome delas É canina e ao mesmo tempo conformista: Um ancião desempregado Amaina o vácuo em sua barriga Com uma suculenta manga dormida. Ah, quando alguém se depara Com a horrenda fronte da fome ------ Sentada no trono de sua opulência ferina ------ Deslinda que o nojo é luxo; Não uma alameda a ser seguida.
Algumas, ao regressar a seu ninho, Comutam refugo em lucro: O que na feira era lixo; Na carente vila de casebres É auspicioso fruto rentável, celeste, divino.
No entanto, para a hoste de grisalhas Barbas engravatadas e garbosas, Este paraíso da lídima e visceral miséria É nada mais que um moribundo resquício De seu passado sem rosas e azaléias.
Não, mas estas pessoas: Estas pessoas sabem Que a miséria cintila até o ponto Em que assoma a dor nas vistas; Que ela é viva, concreta, fenece, fere, Queima e alucina. E ela o faz de inúmeras maneiras: Maneiras que a mais poderosa verve Nunca sequer imagina.
Sim, todavia alheias aos mais atrozes sofismas, Elas prosseguem crentes na vida: Sempre a segurar a ponta do rabo Daquilo que crêem ser a esperança, Apesar do crepúsculo, das mazelas, Das chagas em abundância, Da dor, da amargura e da desabonança! Enfim, elas prosseguem, Mesmo com o mar infinito de desamor, De inclemência, da ausência de ternura E do culto da sentimental distância. Sim, estas belas pessoas continuam a hastear, Embora não saibam, O estandarte do vislumbre de uma vindoura era magnânima. JESSÉ BARBOSA DE OLIVEIRA
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