
CANÇÃO DO COVEIRO
Data 04/11/2018 02:30:04 | Tópico: Poemas
| CANÇÃO DO COVEIRO
Cava, escava, cava a cova! Sua, pena, sangra, lida... Diz ao morto em despedida: -- "Eis tua morada nova! A última de tua vida."
Repete ele um canto antigo (Elegíaco, em verdade...) Pela funda cavidade: -- "Eis tua morada, amigo, Para toda a eternidade!"
Se incerta a vida futura D'alma que partira enfim, Ao corpo ele diz assim: -- "Eis tua morada escura Onde t'encontras um fim!
Mais arruma enquanto canta... Mais amarra seu pé junto... Sem olhar para o defunto: -- "Eis tua morada santa, Onde o silêncio é assunto!"
Fechando a tampa sem dó, Bate os pregos do caixão E sussurra-lhe a canção: -- "Eis tua morada só, A sete palmos do chão...
Desce o esquife até o fundo Feito semente plantada À derradeira mirada: -- "Eis tua morada-mundo, Tu que vais do nada ao nada!
Cobre, espalha, lança, enterra... Fecha a cova para os vivos, Que já se afastam altivos: -- "Eis tua morada-terra D'onde voltam redivivos."
Pondo o nome do sujeito, Resta ele apenas, funéreo, A cantar no cemitério: -- "Eis tua morada e leito Onde dormes duro e sério!"
Canta ainda ao falecido Na lápide ao lhe escrever Latino epitáfio a ler: -- "Eis tua morada ao Olvido, Onde tu deixas de ser..."
Canta o coveiro a canção Que na morte faz igual A todo humano e mortal: -- "Eis tua morada, irmão, Até o Juízo Final!
E ao fim da canção coveira Quando o silêncio se faz Encerra àquele que jaz: -- "Eis tua morada inteira Onde descansas em paz!"
Belo Horizonte - 02 11 2018
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