
OS FANTASMAS!
Data 21/12/2017 00:29:19 | Tópico: Poemas
| Havia fantasmagóricas e silentes vozes, e risos, e choros, e saudosos amores, e desamores que ressoavam por aqueles esquálidos corredores em que me colocava a caminhar solitário nas madrugadas;
e era como se eles tivessem sendo obrigados a deixarem tudo para trás – após apagados –, promiscuamente misturados com as infindas e esplêndidas imagens proliferadas pelos ainda incauto andantes da vida;
e era como se quisessem – mesmo ausentes das senciências vivas e incapazes de com elas voltarem a interagir de alguma forma –
continuar ainda, agora de modo sempiternamente pueril, como templos depositários de comunhão, amor e esperanças;
e era como se eu os tivesse conhecido humanos e; agora, estranha e fidedignamente, sentisse-os como anjos em procissão e sofrimento em busca de alguma purificação enquanto caminham pelo espesso limbo.
Até que, por não sei por qual razão, fui novamente liberado de um tumor que parecia definitivo,
e, ao regressar para casa, a reparar pela viagem os movimentos das árvores, dos carros, das carnes e de invisíveis asas,
pus-me a lamentar minha própria sina, qual seja não lhes ser conveniente que eu fale;
mas antevi minha chegada entres os que esperavam por distante e longa ausência:
todos com as mesmas perguntas e com semelhantes recomendações feitas por enfermeiras, médicos e demais transeuntes do hospital.
Ora, que da parte lume não é difícil decifrar ao sapiens, uma vez que ele enche as bochechas, acentua as orelhas e aguça a visão, foi certa a previsão, exceto por uma coisa:
meus filhos diziam o tempo todo: “Papai, papai, você não vais mais embora? Você levar pra jogar bola? Você vai me dar um presente? Você me leva para nadar?”
Com o peito dolorido, um pouco de morfina ainda correndo às veias e a tosse insistindo em cutucar-me os pulmões,
decidi que sim; alheamente ao que falavam os visitantes adultos, a mulher e a filha já crescida.
E lá, enquanto nadavam, – abrigado a uma sombra de palmeira – Eu contemplava a puerícia e a sublimidade do ainda não se saber ser.
E o vento – como há muito não sentia, trancado que estava naquele prédio em que a morte parecia caminhar desdenhando moucamente dos moribundos –
confidenciava-me aos ouvidos: “Enquanto os adultos esqueceram, as crianças sabem.
Sim – talvez como também os fantasmas que te visitaram à crina de suas peregrinações, tenham redescoberto após suas passagens por aí –;
as crianças, em seus inconspurcos templos, realmente ainda sabem.
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