
EUCARISTIA
Data 14/11/2016 02:25:39 | Tópico: Poemas
| Toma e bebe. Este é o meu beijo perdido de ti o beijo que não te dei à despedida das frésias.
Foi há tanto tempo a primavera que nos desflorou... E agora, na madrugada de espanto tu és a anunciação do inverno e ficas à minha porta enrolando com os teus dedos de raízes os primeiros frios - tabaco húmido entre folhas mortas.
Toma e come. Este é o meu corpo em sede longínqua do teu corpo quente nas tardes de falésias.
Sentes o filho do nosso amor renunciado chamar-te dos confins do meu ventre? - ele é todo o céu que perdemos e está velho, meu amor, também está velho como a gente e acusa todos os frutos por morder toda a pele por dulcificar toda a sedução da luz extinta nas cinzas do teu nome.
O que te posso dar agora senão a submissão dos meus olhos ao teu olhar suplicando o perdão da fome e das fronteiras?
Este xaile que me consagra tua é o destino que cruzei ao peito quando me deixaste e o meu lenço roto e velho não é mais que aquele véu imaculado que as tuas mãos não noivaram...
Mas ainda me lembro da aragem que te trazia. Ainda me lembro dos teus olhos que me faziam querer-te meu a vida inteira. E já esqueci o vento que te levou. Já esqueci que os teus lábios foram portas que as promessas guardadas abriram de par em par.
E agora voltas-me assim, vestido de inverno despido do mundo em fome de tudo devedor de mim.
Sem nada de teu, a não ser a nudez límpida dos teus olhos.
Já que voltaste, paga com o que tens: esse olhar confesso que me traz inteira, do lugar donde vens.
Dá-me a tua fome. Dá-me a tua sede. Este é o meu corpo. Este é o meu sangue.
Teresa Teixeira (12/11/2016) Poema escrito sob inspiração da tela "Agradecendo o lanche", do Mestre Adelino Ângelo, para a festa de celebração dos seus 85 anos, que reuniu 16 quadros (obra magnífica, a do Mestre!) à leitura poética de 16 autores... e muita Arte de Sentir! - Vieira do Minho, 12.11.16, Casa-Museu Adelino Ângelo - iniciativa de Conceição Lima e chancela "Hora da Poesia" (Radio Vizela).
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