
Fonte (Gabriela Mistral)
Data 04/08/2015 11:44:15 | Tópico: Poemas
| .jpg) No fundo do horto, uma fonte viva brota, cega, de longos cabelos, sem ser de espumas ferida, que não atrai, de tão baixa, e não cresce, de tão fina.
Da concha de minhas mãos resvala e foge sombria. E, de abaixada que brota, de joelhos é bebida, e levo a ela somente as sedes que mais se inclinam: a sede das pobres bestas, a das crianças, a minha.
Na luz ela não estava e na noite não se ouvia mas desde que a encontrei ouço-a mesmo adormecida, pois o que dele provém é como punção divina, ou como segundo sangue que o peito desconhecia.
Era ela que molhava os olhinhos das novilhas. E na colheita abundante era ela que ia e vinha, falando com minha fala, que aos pastos arrepia.
Não era a saltos de lebre que da serra ela descia. Subiu a romper carbúnculos e a morder a cala fria.
A velha terra noturna lhe retalhava a fugida; mas chegou à sua querência viajando mais que Tobias.
(No Horto das Oliveiras, Aquele que ali vertia nem o olharam os tronco, e a noite nada vida, e nem se ouviu o seu sangue, de abaixado que corria.
Mas tal água de amargura, que por todos nós foi vista, que nos amou sem sabermos e caminhou dois mil dias, como agora a deixaremos na noite assim desvalida? E como dormir do modo como quando não se ouvia?) Gabriela Mistral (1889-1957), poetisa chilena e Nobel de Literatura.
Imagem: Simeon Larson, pintor sueco.
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