
Momento
Data 03/05/2015 08:41:37 | Tópico: Poemas
| E eu, dividido e disperso no tempo. Dia por dias, passados e futuros, que me imprimem fotocópia. Imagino-me na totalidade, repartido por folhas diversas Respeito instruções, a vida fora do corpo, de uma gráfica universal Sigo à risca e metodicamente o manual do sapiens republicado Onde, à nascença, foi carimbado o meu nome. ... Para amanhã, já me dei à luz Alimentei-me de rotina para morrer ao fim do dia Mas hoje sem a asma que sei que sentirei amanhã pela manhã Sem o ar de frete que me trazem outros na cara na fila do trânsito Sem trabalho, sem almoço, sem cigarros, sem mais trabalho a tarde toda Sem o embrulho no estômago...(jindungo no cu de todos os meus eus) Sem luzes agarradas aos faróis na fila de volta a casa Sem banho, sem jantar, sem bola na TV, sem cama e sem sono Hoje, sem nada do que me fará ser eu amanhã.
Delírio passado ou verborreia inútil? Nasci em partos complicados e criei-me igual todos os dias E nem em um apenas, me mandei a merda e fiquei a dormir. Noites, insónias suadas E guilhotinas suaves para encadernar vida em pensamentos. Lição futura ou cáustica previsibilidade? Crio-me de novo, cómodo, e de novo para o ano inteiro Amamento-me hoje nos lençóis surrados da preguiça de os mudar amanhã ... E eu, tantos Já sou tantos, antes e depois, que agora, não sei qual sou realmente Que importa, sou todos, uns iguais aos outros E de todos não quero ser nenhum de mim Convoquei-os, mesmo àqueles que já esqueci Reunião, assembleia-geral, eu com os meus eus reunidos à minha volta Todos intimados a escrever sobre quem sou.
O tempo não existe E eu, momento, folhas brancas. Folhas brancas Ou uma vida inteira.
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