
Porque tem a poesia palavras tão difíceis?
Data 12/09/2012 15:56:10 | Tópico: Poemas
| [pergunto-me]
Porque tem a poesia, por vezes, palavras tão difíceis de entender? Será que os poetas as sentem, Ou simplesmente as procuram em incógnitos dicionários de sinónimos?
As palavras, diz o povo, são como as cerejas, Eu nunca senti em mim florescer qualquer flor Nos meus lábios Uso a palavra pelo prazer de a sentir Sai de mim em voo na direcção das altas montanhas. Tenho em mim as palavras das mulheres e dos homens da rua, Palavras simples Escondem as metáforas nos seus olhos vazios Nas cavernas das rugas das suas faces.
[Ingénuo]
Pensei voar ao teu redor num tapete das mil e uma noites Queria fazer despontar em ti uma flor Por isso, quando olho as cerejeiras em flor As invejo As minhas palavras não foram um mar Mas um poço - sem eco Sem luz - Sem a água das palavras
De que minas, de que campos, de que casas vêm as palavras dos pobres?
O poema antes de ser poema É uma pedra de palavras. No âmago da pedra já se encontra a essência do poema, O poeta - um escultor de palavras - Sente a angústia do cinzel e do martelo Na descoberta do poema escondido.
[E retalhada a pedra o pó entra-lhe nas narinas]
O poema antes de ser poema Congrega palavras num novelo de grãos de pólen dentro de um almofariz Ansiosos por fecundarem os estames da poesia.
[Aparentemente o poema parece ser algo de simples – e é simples - Então porque são as palavras complicadas?]
Eu sou um simples burilador de poemas, Procuro em cada palavra o sentimento, O cheiro, a cor, E o som.
Gostava de me sentir dentro da poesia, Numa caixa de vitral multicolor
[Desdobro os cantares alentejanos na taberna do carvoeiro – galego - fugido da guerra de Espanha]
Vou às raízes da minha rua, Embalo-me no som das sirenes das fábricas do bairro onde cresci, Em cada janela há um postal ilustrado Há uma musica que me chega de tudo o que é buraco nessa rua, Das bocas-de-fogo, Das sargetas, Das dos botões de campainha inexistentes. Há o som de um piano por trás de uma cortina numa janela fechada. [Foice]
Das planícies do trigo e das papoilas, Mulheres, homens, crianças Vieram vestidos de negro - O Tejo o seu mar Das tormentas - capote de pastor, Chapéu de maltes a sombrear os olhos Tez casca de sobreiro Pousaram como andorinhas tristes Na quinta da Porcalhota Onde patos bravos emprenharam a terra De edifícios frios Violadores da estética E apedrejaram os pássaros dos campos de trigo Que os emigrantes traziam no peito. É aqui que encontro sons A linha recta das palavras. Por vezes, confesso, as palavras nem existem. Só existe um som, uma cor, um sentimento E ficam letras em forma de notas musicais na folha de papel, Depois andam dias e dias a burilar Em ricochete na minha cabeça Até que um dia (há sempre um dia, nem que seja para desistir) Encontro a palavra que transporta em si o som desejado. E assim nasce aquilo que ouso chamar de poema.
Paro de escrever!
[Agora pergunto a ti, poetisa, que deixaste de escrever]
Porque matas a poesia que há em ti? Como consegues respirar sem o ar das palavras?
[Uma dúvida]
A liberdade é uma bandeira sem palavras?
[Ponto final]
Não faz sentido aqui o parágrafo
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