
Aquecimento Global
Data 01/06/2012 11:00:25 | Tópico: Poemas
| Com a voracidade que nos é peculiar solapamos o direito de outrem compartilhar esse pequeno ponto azul que nos foi dado habitar. Matamos bichos, árvores, águas e o próprio ar. Agora, o Aquecimento Global sinaliza que é tempo do Homem acabar. Pandemônio, caos, vigílias, promessas e muito rezar. Talvez alguma religião possa nos consolar; pastores, bispos e pais de santo põe-se a clamar: misericórdia! Carolas gritam que é o anticristo a chegar, imploram aos Céus, mas não descem anjos para ajudar. Nos terreiros, os orixás não aparecem para nos salvar. Kardecistas insistem, porém o "espírito de luz" deixou-se ficar. Confuncionistas pregam obediência a quem for nos mandar. Budistas afirmam que só a YOGA pode nos remendar. E filósofos põe-se a teorizar, enquanto os práticos põe-se a aproveitar: bêbados a gargalhar, loucos a dançar e virgens a namorar. Otimistas dirão que o copo está a transbordar. Pessimistas, que o copo irá quebrar. Jovens não ligam. Idosos hão de lamentar. Militares põe-se a coordenar, maus políticos a se locupletar (pois a coisa pode melhorar). Terroristas e fundamentalistas deixam de lutar. Já não há o "Deus Certo" a quem se deve adorar. Afinal, sem Homem, para que Deus?
Os cavaleiros apocalípticos reinam e o horror chega para ficar. Há fome, sede e peste. Nada pode sobrar, como disse Deus a Josué em nosso limiar. Os países ricos ficam a derivar, os pobres continuam a mendigar. Todos a delirar. As raças perderão do que se orgulhar. Ou do que se envergonhar. Se tudo já não têm sentido, por que sonhar? A Terra aquece e a Natura expulsa a espécie que lhe calhar. É o fim da história, da cultura, da filosofia. O máximo que se pôde criar. Do minimo, nem é bom falar. Talvez quem nos substituir seja mais sábio. Compreenda o bicho pequeno (mestre Camões) que vive neste pátio. Ainda que imagine catedrais, contentar-se-á com o átrio. Pois saberá que um passo a mais, é invasão. Desejo sórdido, poder em vão. Co-habitará com outras espécies, mas será Senhor apenas de si. Não se rebaixará a roubar alheias messes. Constituirá, talvez, sociedades, artes e filosofia. Saberá que ao não matar, o quanto se cria. Por fim, entenderá que a morte do indivíduo não é um elo partido. É apenas a vida mudando de vestido. Será leve, diáfano tecido. Haverá, quem sabe, de viver mais sem que o seu tempo seja estendido. Também saberá que não há hierarquia, pois esta é apenas um devaneio da esquizofrenia. Admitirá Darwin, pois tudo evolui. Mas rejeitará Spencer, pois vê que sem barreiras, o rio melhor flui. E quando chegar a hora de sua espécie descer deste trem, fará de maneira sóbria, sem tamanho alarde. Saberá que tudo passa, assim como o azul de qualquer tarde.
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