
A Casa (Gabriela Mistral)
Data 03/03/2012 11:32:11 | Tópico: Poemas -> Sociais
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A mesa, filho, está posta em brancura quieta de nata, e em quatro paredes que mostram sua cor azul dando brilhos, a cerâmica. Este é o sal, este o azeite e ao centro o Pão que quase fala. Ouro mais lindo que o do Pão não acha nem em fruta nem em giesta, e do seu odor de espiga e forno uma fortuna que nunca sacia. Nós o partimos, filhinho, juntos, firmes os dedos e palma branda, e te assombras vendo-as tão branca flor nascida da de terra escura.
Abaixa a mão de comer, que tua mãe também a abaixa. Os trigos, filho, pertecem ao ar, e são do sol e da enxada; porém este Pão “cara de Deus”* não chega as mesas das casas; E se outras crianças não o tem, melhor será não o tocarmos, melhor será não o comermos, sentindo-nos envergonhados
Filho, a fome, com seus trejeitos, Em redemoinho roda as searas; buscam-se porém não se encontram o pão e a fome corcovada. Para que o ache, se entra agora, guarde-se o pão para amanhã; o fogo ardendo marque a porta que o índio quechua não fechava. E se virmos comer a fome dormiremos de corpo e alma.
Gabriela Mistral, poetisa chilena, premio Nobel de Literatura.
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