
O Caçador de Raízes (Pablo Neruda)
Data 05/09/2011 20:10:41 | Tópico: Poemas -> Introspecção
|  Canto a grama que nasce comigo neste instante livre, os fermentos do queijo, do vinagre, a secreta floração do primeiro sêmen, canto o canto do leite que agora cai de de brancura em brancura aos mamilos, canto os crescimentos do estábulo, o fresco esterco das grandes vacas de cujo aroma voam multidões de asas azuis, falo sem transição do que agora acontece com a abelha e o seu mel, com o líquen e as suas germinações silenciosas: como um tambor eterno soam as sucessões, o transcurso de ser a ser, e nasço, nasço com o que está nascendo, estou unido ao crescimento, ao surdo contorno de tudo que me rodeia, pululando, propagando em densas umidades, em estames, em tigres, em geléias.
Eu pertenço à fecundidade e crescerei enquanto crescerem as vidas: Sou jovem com a juventude da água, sou lento com a lentidão do tempo, sou puro com a pureza do ar, escuro com o vinho da noite e só estarei imóvel quando seja tão mineral que não veja nem escute, nem participe do que nasce e cresce.
Quando escolhi a selva para aprender a ser, folha por folha, estendi minhas lições e aprendi a ser raíz, barro profundo, terra calada, noite cristalina, e pouco a pouco mais, toda a selva.
Pablo Neruda. O Caçador de raízes, In: Antologia Poética, José Olympio, 1994, p. 232.)
Arte surreal por Tiffany Bozic "Inspiration Grid"
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