
UMA CRÕNICA TRISTE. O ANIVERSÁRIO.
Data 24/11/2010 00:18:11 | Tópico: Poemas
| Pai,afasta de mim este cálice..."
De Chico Buarque e Gilberto Gil
Hoje comemora-se a data - comemorar não é o termo certo- em que arrancaram meu pai de casa. Faz tanto tempo. Minha irmã Sônia, cinco anos mais velha do que eu, viu toda a brutalidade. Eu não me lembro. Minha irmã, mais do que a mãe, que hoje também não há, sempre me protegeu, talvez por ter sido o mais novo. Sônia sempre comprou minhas dores, até nas brigas de amor, quando eu não tinha razão. Meu pai era diplomata de carreira e professor universitário. Membro do Partido Comunista Brasileiro, do qual faço parte até hoje, com muito orgulho, vieram à porta de casa buscá-lo para um depoimento. Era só isso. Papai foi sabendo que não era só isso. Sônia me contou que antes de sair ele pediu que protegessem a gente. Do contrário, ele morria, mas matava também. Alguém ele levava junto. Sabia atirar bem: tinha treinamento de guerrilha. Anos depois, já homem feito e jornalista, eu viria a ser preso também. Lembro-me de um interrogatório porco na polícia política em São Paulo.Minha mãe e minha irmã, as duas com o coração na boca, num banco, no corredor da delegacia: - O senhor é comunista? Sua peça, Pelo Séculos dos Séculos está vetada pela censura. Eu respondi que num país de merda tudo é possível. Ele, o delegado, disse que eu podia ser incurso na lei de segurança nacional, por subversão e desacato. Cometeu o abuso, mesmo eu tendo curso superior, de me colocar numa cela comum. Fiquei duas semanas com presos normais. Me tornei amigo deles. O advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira me defendeu de graça. Eu não teria como pagá-lo. É tido o maior criminalista do Brasil. Fui ser seu assessor de imprensa depois, quando ele assumiu à Secretaria de Justiça de São Paulo. E eu tive o direito de mandar o delegado que me prendeu à puta que o pariu. Chumbo trocado não dói.
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júlio
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