
Inda He Inda He Indahehe
Data 31/05/2010 20:17:46 | Tópico: Poemas
| Os galhos dos salgueiros esticam os dedos na direcção da praia Onde dança a tua voz, confundindo-se com o som das ondas E com o sabor da maresia; os salgueiros estão lá no morro de onde Te espreito: descalça pisando as areias quentes sob os teus pés – nua nadando por entre um mar de mescalina. Lá onde eu morro Já antes de mim morreram outros, mil outros mais, diabos e anjos Cujas ossadas foram já desfeitas pelo lento languidescer dos séculos E pelo peso do teu corpo e da tua voz. Faço-te adeus, apesar de me Não veres – aqui invisível aos teus olhos me prostro a morrer, acenando O sol que se deita para lá do horizonte na tua cama. E os gemidos Delicados das ondas que beijam a praia levantam das suas sepulturas Os espíritos de todos aqueles outros que morreram já antes de mim: Uma tribo de índios, uns velhos e outros novos, estes de peito duro E castanho queimado pelo sol que reina alto, aqueles de peito mole E castanho queimado pelas fogueiras à beira das quais se habituaram A dançar. E dançando e cantando para lá da morte continuam:
Inda he inda he inda he indahehe! Inda he inda he inda he indahehe!
Ainda te ouço mas já te não vejo; o cântico dos índios ecoa pela tua garganta – ou a tua presença pela garganta deles, quem sabe? Eu só sei que hoje é Uma boa noite para morrer: por isso dançarei na companhia dos índios, Promíscuos, felizes, ao som da tua cantiga de embalar. E quando me deitar, tal como o sol se deita para lá do horizonte na tua cama, Esticarei os meus dedos uma última vez e colherei um punhado De folhas de um salgueiro dobrado pelo teu sopro (sim, eu sei que me esperas lá Na linha do horizonte); e espalhá-las-ei, jogando-as ao ar, sobre o meu corpo Nu e prenhe de música – e de imortalidade.
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