
Tempo que não volta
Data 10/03/2010 00:26:48 | Tópico: Poemas -> Saudade
| Vielas, vilarejos e aquele ribeirão O sonho bordado nas janelas, o casarão As redes nas varandas, a gente na calçada
Os passeios junto às árvores centenárias Na praça dos encontros e desencontros Os bancos de concreto, bons pra coluna
O rodopio e a chegada no mesmo ponto A Maria fumaça que era trem e alegria A conversa do velho Bóia, as mentiras do Eurico
As garrafas de leite na porta, as bananas nanicas, ouro e maçã do Pimenta olha o padeiro, verdureiro, tudo na caderneta
Ao tempo do café moído e torrado em casa Da broa de milho com erva doce E da boa prosa que rolava na cidade
De Bert Kaempfert ao Tijuana na velha vitrola Do Teixeirinha ao Ray Charles que emoção Dos seriados Anjo, Jerônimo - o herói do sertão
No tempo do rádio de válvulas, Da CIA com sua "Voz das Américas" E do mingau de trigo da "Aliança para o Progresso"
Ah, este tempo que ouvia falar de reforma agrária Da trinca de Jotas: Juscelino, Jânio e Jango Até colégio fechar e surgir a trinca ditadura
Tinha 10 anos, e me punham medo do vermelho do Prestes, do Arraes, do Brizola Meu pai ouvia o movimento no rádio clandestino
Mas, havia o circo, do pobre leão magro do palhaço perna-de-pau, dos trapezistas voadores, do mágico
Vielas, vilarejos e aquele belo açude, o tempo de cair na água do Náutico e ser peixe o tempo de subir nas árvoves e ser macaco
O tempo de tragar cigarro de palha e ser grande o tempo de soltar pipa e ser pássaro o tempo de pegar na mão da menina e ter arrepio
Ah, tempos idos, mas nunca esquecidos das travessuras, ingenuidades e descobertas das coisas boas e ruins da vida
Ao tempo de olhar nos olhos, de sinceridade de roubar um beijo e corar, palpitar o peito do desabrochar da adolescência e sua rebeldia
Tempo de desafiar as convenções, de transgredir de botar o pé no mundo e o rumo da vida assumir Deixando pra trás a Vila e seus encantos...
AjAraújo, o poeta humanista, poema dedicado a minha Vila querida: Santanésia, distrito de Piraí, recordando meus 10 anos passados durante a queda do governo de João Goulart, escrito em 1980 e revisitado em março de 2010.
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