
“o amor é fodido”.
Data 26/09/2009 20:52:24 | Tópico: Textos
| estive carente, não sei se vos contei. a minha cama suportou os meus oitenta quilos de fazer água na boca a qualquer canino desta rua. febre alta, comichão nas partes, olhos de quem não vê senão a luz ao fundo do túnel, tremuras, escarros para o velho e refiscado penico debaixo da cama centagenária.
cristo na parede com ar de gozista. rezei, cantei em tom desmiolado, não atendi chamadas telefónicas, trostky à cabeceira, sonho e realidade em guerra, não sabia de que lado me ia pôr.
o dia lá fora: um retrato antigo. chamem o padre que eu preciso de me salvar, por dentro principalmente. ter a mão na bíblia, acariciá-la, espetar-lhe uma unha, invocar santos tresmalhados, arranjar uma palavra para salvação. pensei em desistir. o frio era muito. talvez demasiado. tenho cartas por escrever. as amantes que esperem. é pena que as coisas acabem assim, sem cerimónia, sem um som que estremece. não sei o que me fascina. se um vodka ou fatia de melancia. adio decisões. o meu patrão que espere. penso em poesia de fazer chorar. e choro. sou assim. que me desculpem os homens com quem eu refilei. o amor é uma pedra em bicos-de-pé. qualquer doença dá que pensar. apetece-me partir para aventuras e levar livros com menos de cinquenta páginas.
a noite é já outra vez. os grilos cantam porque cantar faz sonhar. mas eu não sei cantar. talvez um dia. a bem dizer, moro na curva do desespero e tenho a sorte de ver espectáculos de graça sobre miséria e frustrações.
não sei se vos contei, estive carente. foi preciso dois baldes de cimento para não deixar ruir meus sentimentos. tudo abalava. desde o carpo à carótida. por quê não sei. não porque fume demais, nem é o facto de certa vez ter sido enganado pelo silêncio. ou engasgado? nem sei se tenho as vacinas em dia para combater a solidão. ou se vale a pena mais xaropes e messinhas. mas de uma coisa tenho a certeza: “o amor é fodido”.
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