A Fogueira
Como uma árvore, que acariciada pelo vento, balança suas folhas em chamados.
Como a chuva, que escorrega maliciosa, nas paredes dos prédios, trajetória seguida por um ponto.
Como a música, que inflama a alma e eleva a matéria.
Como o doce, que lambe-se.
Como pelos, que aquecem, fogem presos e flutuam até pousarem entre nossos lábios.
Como segredos, que aproximam os lábios da pele em sussurros.
Navegar sobre, entre, para, além.
Oceano dos céus. Entre vidas.
Para sempre. Além do bem e mau.
ruas da memória
as ruas da minha memória
eram de terra batida, chovia
ainda recordo o cheiro a terra
desse tempo de nostalgia
tudo incrivelmente distante
brincávamos na rua
vivíamos sem medo
a aldeia era minha e tua
e a amizade o segredo,
banhávamo-nos no rio
para aguentar o calor de verão
e no inverno à lareira vencia-se o frio
café ao lume, fatia de pão
na mão...
ouvia-se o vento
enquanto a tempestade passava
e com Deus no pensamento
pedia-se em oração
e a tempestade amainava.
tudo era simples assim
o pai tratava da horta
e a mãe dos filhos e do jardim.
havia fotos penduradas
na parede
antepassados que não conhecia
olhava-os dia após dia
«dali ninguém os arrede
que à avó são familiares
tios, avós, pais, e netos
ali nas fotos aos pares»
tempos de poucos afectos
de reprimidas emoções
de sufocados desejos
também de desilusões
alimentando-se ansejos
mas recordar me alimenta
guardo sempre esta vontade
e nesta manhã cinzenta
de silêncio vazia, chega a mim
a nostalgia
tudo lembro com saudade.
natalia nuno
rosafogo
Rios tortos
Todas as árvores no olhar
fizeram sentir
deixaram-me a chorar
O brilho do estio
naufraga a ave
de pio fatigado
descarnado
de um cadáver adiado
em pedaços
pensamentos
sem leveza
para chegar ao céu
acercam-se da terra
que os alimenta
de rios mortos.
O Astronauta no quintal
Com os pés rijos no chão
Alinho-me acima do horizonte
Contemplo o infinito
E as minhas trivialidades
Laços indissociáveis
De minhas contradições
Alçar voo
E carregar o planeta sob meus pés
Hora sou Fênix
Hora avestruz
Caminho reticente
Entre meus sonhos e minhas realizações
Sonhar rotinas
E realizar fantasias
Parece o quinhão da vida sem o "hoje"
O carpe diem do café da manhã
O inesquecível do molho na camisa
O indecifrável cheiro de lar...
LOCAIS E LATITUDES
LOCAIS E LATITUDES
O frio milenar dos chãos nos pólos
O calor aerado dos trópicos
Insetos que permeiam os solos
Lágrimas claras a molharem colos...
O sol a pino a perfurar a mata
A chuva aguda ao regar das ruas
A lua e seus refletidos de prata
As caídas damas das noites nuas...
Tantos tentam inglórios alterar
Os retos destinos inevitáveis
Dos andares das carruagens
Mas a humanidade os ignora...
Nada, em verdade, neles reage
E tudo age por mãos de ávaros
Seguindo um minucioso plano
Traçado desde os povos bárbaros...
O amores não correspondidos
Os pobres carentes de rotas
Os ranhosos meninos perdidos
Os engraçados nas anedotas...
Choram como almas que brincam,
Amam ou odeiam ao relento...
Só crianças cantam em cirandas
Replicando o bom fluir do tempo...
Relógio de vento a um só lugar
Rodas-vivas de vidas que giram
Entre férteis terras e agitados mares
Desertos quentes e inquietos bulevares...
Não, não são os locais, nem as latitudes!
É o homem e sua retorta interpretação
De que ele mesmo não pertence à esta natureza!
Ele é o todo de tudo que aparenta não ter solução
LIDA CAMPONESA
LIDA CAMPONESA
Na lida dura do dia
Não vejo o tempo que passa
Talvez ainda haja graça
No cansaço que vicia
No suor caindo do rosto
Alimento o sabor de viver
Os dissabores, esquecer
No trabalho que dá gosto
Mãos sujas coração limpo
Pele de escura tez
Revela meu tino camponês
Traduzindo o que sinto
Remexendo a terra amiga
Abrigando tantas sementes
O céu abençoado assente
Com o fruto que mina a fadiga
E porventura alcançar
O dia que a lida termina
A terra incessante germina
Meu corpo que nela deitar
Então carrego minha gratidão
Pela terra que alimenta
Tantos famintos sustenta
Sem cobrar pela missão
Que esteja ao meu alcance
Na lavoura trabalhar
Meus dias eu possa terminar
E nela meu corpo descanse
RESPEITO!
Respeita cada palavra minha
Cada sílaba que eu deposito aqui
Com amor e dignidade
Respeito quem me comenta
Cada palavra minha é uma oração
É a minha saudade a falar mais alto que o meu ser
Cada palavra é um sentimento
Que nem sei explicar!
Mas fica para tu leres com respeito
Com amor
Pois só com amor me entenderás!
Cada momento de nossas vidas
É e será uma palavra cheia de amor...
Cada sentimento nosso é uma luz de esperança...
Cada dia de nossas vivências é uma sabedoria...
Então fica com estas minhas palavras
De reflecção e me dis o que achaste delas!
Autora:LuiZacarias
vizinho das nuvens
As horas que passei sentado à espera...
Um dia compreenderás porque trago uma lança
atravessada lado a lado...
Vizinho das nuvens,
vivo algures entre o céu e a terra
e não sei de que terra sou,
pois nas minhas mãos não existe lama que me possa identificar.
Terra minha, meu céu.
Por debaixo dos meus pés, só basalto e calcário, chão
demasiado hermético para me identificar.
E eu que gosto tanto de andar sem ferir as pedras...
Queria ter granito e terra e lama e flores e arte e amores,
tocar em farrapos de nuvens que lentamente se desprendem
do lado do mar
e formam formas que atemorizam os bandos de andorinhas
que voam cá dentro, no céu de mim...
Um dia...
Um dia saberás o que te quis dizer...
A Volta ao Mundo
A Volta ao Mundo
O mal domina nas encruzilhadas da vida.
Abri os olhos na China, e não gostei do que vi;
Homens escravizados... mão-de-obra a um Euro/dia.
Soletrei o Mandarim incompreensível e continuei.
Na noite de Las Vegas fui jogador de Pocker,
Mas tanta Luz fez de mim um mendigo.
Acordei meio nu na casa de uma mulher
De reputação duvidosa.
Pedi desculpa no país do Tio Sam.
Tomei banho na piscina municipal e apanhei o autocarro.
Acordei na terra de Simon Bolívar.
Escorreguei no pó e fiz uma trip de heroína.
No convés de um barco clandestino,
Acordei em Cádis;
Seguiram-se os trâmites da praxe,
Com pontapés e coronhadas à mistura.
Maldita Espanha!Me voy para Francia:
Terra de Liberdade, Fraternidade e Igualdade.
Tumultos de cores variadas:
Tanto descontentamento, tanto ódio,
E tão pouca Fraternidade.
Estarei acordado? Com clareza,
Mas não é uma certeza.
Tenho de partir clandestino
Para uma floresta tropical,
Fazer valer o meu saber de ocidental.
Poesiadeneno
Quem conta um conto gosta de fazer de conta que não aumenta um ponto.
Vão se os anéis, ficam se os medos.
Antes tarde do que mais tarde ainda.
Água mole em pedra dura, pare com o desperdício!
Quem avisa, algo quer!
Quem tem boca, que fique bem quietinho em Roma.
Antes só, do que abandonado.
Mas vale um pássaro na mão, do que dois extintos.
Não dá pra agradar Russos e Americanos.
Em terra de certo, o ignorante é Rei!
A esperança cometeu suicídio.
Simplesmente através dos ditos podemos dizer aquilo que não é dito, e assim sempre repetido como se fosse um lazer.
Mas como não sou Santo e nem Bendito ou Benedito, assim me farei!
Pois só depois de ter vivido poderei dizer quem sou eu!