O POETA A LUA E O IPÊ
Em ti me pego sempre pensando,
Olho a bela lua e começo a tecer.
Será que também esta inspirando
O poeta seus sonetos a escrever?
No farfalhar das folhas dançando,
Ela adora brincar e surpreender.
Em ti me pego sempre pensando,
Olho a bela lua e começo a tecer.
Pela janela tudo fica observando,
Por detrás do Ipê a se esconder.
No papel versos vão nascendo,
Sentinela até o poeta adormecer.
Em ti me pego sempre pensando.
Carol Carolina
ANDANDO NA CHUVA...
ANDANDO NA CHUVA...
Andando na chuva
Numa tarde calma
Afoguei as mágoas
Eu e minha alma
Eu e minha alma
Aqui lembrando
De coisas minhas
Continuei andando...
Continuei andando
Sem ligar para nada
Vendo meu reflexo
Na calçada molhada
Na calçada molhada
Nada para descrever
Só o coração sentindo
Não vou te esquecer
Carol Carolina
O balanço
Em uma árvore no alto da colina
Tinha um balanço que hoje é lembrança.
Lá ficaram os sonhos da menina
Se balançando em fantasias de criança.
A menina até ao céu cantarolava
E sua voz se espalhava na colina
Quanto mais o balanço balançava
Mais alto cantava a menina
A menina não sabia o q' era dores
Apenas se entretinha a balançar
Cantava sorrindo para as flores
E só com flores vivia a sonhar
Um dia deixou de ser criança
Mas não matou dentro del' a menina
Quis retornar a balançar naquela dança
Quand' o balanço já não está mais na colina.
A leste das minhas mãos
Um dia apeteceu-me perseguir as palavras certas.
Aquelas que são feitas das coisas que nascem,
que vivem, que crescem, que fazem morrer.
Aquelas feitas da consistência dos sonhos,
do risco das asas, do prolongamento do olhar,
da fé dos silêncios, de sorrisos limpos
ou de pensamentos fáceis.
E das coisas fundas... ah, das coisas fundas,
como não querer achar a profundidade certa
onde se encontrem palavras que as saibam...?
Apeteceu-me a criação, a original forma de dizer.
Terras novas.
O puro descobrimento.
...
As palavras ardem. As palavras são cinza, são fumo a acontecer.
Queimam-me as mãos, reduzem-me ao nada, dispersam-se ao vento.
São sinais...
Só meros sinais.
Como dizer da indelebilidade dos gestos?
Como dizer da nitidez dos efeitos,
da heterocromia do olhar,
da essência das águas
que nos percorrem em grito?...
Como dizer da sede que nos fica, depois da vontade?...
Ou da fome que nos beija a boca, depois da saciedade?
Como dizer por palavras
que a vida não é feita de domínios, nem de fronteiras?
Que as frases não se reduzem a marés lavradas?
Que a vida não é feita de sinais, mas de Marcas...?
(ah, um dia ainda hei-de inventar palavras Verdadeiras...)
A vida é mar em desassossego, e as palavras que eu persigo
são a sua espuma viva
vestígios de luas a leste das minhas mãos
ilusões de vela náufraga
sangue sem pertença flutuando à deriva
pedaços de madeira onde me agarro
murmúrio indefinível dos lugares onde já fui
e onde não mais voltarei.
E o meu papel, o barco que abandonei.
...
tenho sede de tempo...
tenho sede de tempo,
cai a tarde
como fruta madura
e à distância cantam os pinhais
o sol já não arde,
tocam os sinos dando sinais
e eu aqui oculta pela bruma
lembrando tudo,
tanta coisa uma a uma.
lembro o caminho da nascente,
com os risos de então
lembrança sempre presente
que não rejeito...não!
quero ser criatura
de alegria,
trazer à minha noite o luar
e eu e tu ser um só rio
a desaguar no mar...
extingue-se mais um dia
entre matizes amarelos
tenho sede de tempo
dum tempo primaveril
aquele que me vestia
a alma
e não este, que é prisão
e me corrói o rosto,
e esvazia o coração.
dá-me a mão,
vamos caminhar mais agéis
viver mais intensamente
onde o limite seja o céu
só tu e eu.
por algum tempo havemos de ignorar
o que de nós se perdeu
vivamos mais outro dia,
antes que a noite venha perturbar
ergamos nossa rebeldia
e quando a morte vier
num outro dia qualquer
pairando como um gavião,
sobre nós,
dá-me a tua mão
quando já nada haja para crer,
resta em mim a credulidade...
ainda assim vou sentir a doçura
da tua mão
na minha mão,
e levarei dela saudade.
natália nuno
rosafogo
31 de boca
Sim,
sou uma em muitas, e então?
múltipla em só uma, porque não?
una e indivisível, e depois?...
sou todas, do todo que vós sois!
:
Sou frente, sou perfil,
Sou rente, mas asa, se quiser,
Sou gente ou animal!
Sou jovem, sou senil,
Sou homem, mas posso ser mulher,
Sou nome assexual!
Sou calma, sou febril,
Sou salmo ou mantra por escrever,
Sou alma e sou carnal!
Sou pimenta, sou caril,
Sou tormenta sem Adamastor saber,
Sou a semente do sal!
…
E se assim sou estas coisas,
tão diferentes e tão várias,
é só porque, em queda e glórias,
represento a Criação,
não me conformo com cópias
ditadas por frouxa mão!
E se me desdobro e reabro,
se me provoco e recargo,
é só porque este é meu fardo:
ser de ninguém e de tantos
que alguns haverá gratos
por lhes provocar espantos!
Não tentem dar-me um só nome!...
Acaso ARTE é pessoa?
Acaso LUZ é uma cor?
-
A Arte é aluna indómita!
Cor sem Luz é forma incógnita!
…
-e que é dos caleidoscópios?...
-que é da relatividade e dos binómios?...
-e que é dos heterónimos?...
(que falta fazes, Fernando!...)
…
Só tendes trinta dinheiros
que vos deram à nascença...
Ganhar mais um pro barqueiro,
faz parte da vossa crença…
(…ou dois:
o ler e o depois,
e o resto, não é excesso,
é diferença!)
...
Mas vos digo:
o eu-poético, reneguem,
em impudente heresia:
além daquilo que escrevem,
só existo - eu-Poesia!!!
Toca-me.
...
Não te aproximes mais,
fica aí,
à distância das memórias por não ser,
no limbo dos princípios,
no silêncio das coisas por dizer.
Fica,
não te aproximes mais
(de mim).
Poderás queimar-te no frio intenso da falsa lonjura,
poderás arrefecer as mãos no calor das reais aparências,
não vês...?
(Há três pelinhos brancos, a apagar-me as sobrancelhas, um enredo de atalhos a confundir-me os caminhos do rosto, erros do tempo manchando a minha pele.
E o cabelo, já não é feito do ouro antigo que a minha mãe usava ao peito, em delicada filigrana... Não, troquei-o por bijuteria moderna, de pouca dura, e brilho artificial.)
Não te aproximes mais,
fica aí,
à distância das palavras por escrever,
na fímbria dos indícios,
na certeza das coisas por viver.
Fica.
Não te afastes mais
(de ti).
Poderás magoar-te na saudade imensa da real ternura.
poderás curar-te do cómodo vício de falsas vivências,
não vês...?
(Há uma riqueza maldita, nos subterrâneos do meu ser, uma mina encantada que nunca chegarei a saber se é de ouro, de prata ou de pragas. Já me pisaram tantas vezes, que a minha pele se fez terra, os meus braços, árvores, os meus olhos, asas. Se sei voar, se te iludo azuis, lembra-te, trago por dentro ventos que os olhos não vêem, cores que ninguém inventou, restos de reconhecimento, encantos de ser próprio que ainda ninguém tocou.)
Aproxima-te, se quiseres,
vem aqui,
para perto do que há a perceber
ao alcance dos inícios,
na dúvida das coisas por saber.
Fica,
se ficar for permanecer
(assim)
respeitando os estragos como antigos livros de aventuras,
coabitando em mim sem luz nem guia, apenas por instinto de sobrevivência.
Eu sou o livro que sempre
tiveste,
mas que nunca
quiseste ler.
Toca-me.
penduro o silêncio no quarto
Começas por ler, e habituo-me
a tomar
o café já tarde pelo teu
arco-íris.
Penduro o silêncio no quarto,
e a estação
de dormir as rosas foi já há
muito;
um vento levou-a com o giz dos
pássaros
e, por isso, não me escrevas nada:
a tua noite já me morreu
e agora
tenho rosas no
céu.
O que me fizeres será um lago
coroado nos lábios;
o que me fizeres será um barco
escrito a cinza,
e depois um Inverno
para quem me viu com
a tua sombra
a imprimir
o mar
Quando a Chuva Passar
O vento gela meu coração
movendo a água da chuva
Com o frio
restos de sonhos são levados
assim como os antigos amores
Sigo solitária o meu caminho
Tentando alcançar o tempo
A vida vai correndo
Durmo nas paradas
Não desejo freiar nem chegar ao fim da estrada
Quero viver
Ir em frente
Posso até pegar atalhos
Molhada, danço ao vento para me secar
Nem tudo acaba em tempestade
Sei que nos trilhos de um novo dia
irei te encontrar
Teu mistério irá me aquecer
As nuvens dissipar
Em dias de Sol e noites estreladas
iremos bailar!
Teu corpo, meu poema
Atravesso as cordilheiras
do que me é impossível
vou desenhando suas fronteiras
horizontais,
enquanto sobrevoo sua geografia
e os traços marcantes em sua pele.
Suas planícies revelam seus arrepios
trazendo na brisa dos seus sussurros
tudo o que eu desejo ouvir.
Não há limites nas dobras do seu corpo
seus planaltos aquecidos se misturam
com a mata selvagem de sua derme.
Seu olhar intenso é o sol que nasce
no meio das montanhas dos seus ombros
mostrando o quanto me deseja nesta hora.
E depois desta sede imensa
que me dá descobrir sua natureza
em toques verticais,
derrama seu rio em mim
pelas nascentes do seu sorriso
e sensações vindas dos seus portais.
Diante do seu corpo,
eu virei céu.
*Poema escolhido na Antologia de Poetas Brasileiros Contemporâneos Vol 94 - CBJE - Rio de Janeiro - Lançado em 20/11/12.