Parte I
Curiosa, a característica humana do hábito. Fernando, teve em tempos o hábito de afirmar o desprazer que as rotinas lhe causavam. Havia uma ânsia a invadi-lo, no instante de se aperceber
executar uma rotina. A sua vida era uma sucessão de tarefas estrategicamente estudadas e agendadas. Esforçava-se por isso, pelo menos. E completava, dizendo ser o método a sua arma contra o caos. A atitude metódica e sistemática resultando em organização. Sem nunca o ter dito, pensava no sucesso conquistado com tanta preocupação e considerava-o um presente do rigor. Família, amigos e negócios, tudo estava bem. Havia segurança nas suas palavras bem ponderadas. Os assuntos sucediam-lhe com oportunidade e dinamismo.
A empresa, herança do avô e do pai, foi o instrumento de afirmação pessoal, a prioridade de sempre. Em contrapartida, recebia o reconhecimento, cujo desejo notava em tantos à sua volta, por vezes até como inveja. Fernando sentia ser um homem de sorte, sem imaginar que tudo e nada iriam mudar. Foi um repente. Não de um dia para o outro, mas em três anos, tudo o que acreditava seguro foi-lhe faltando, traindo ou afastando. No seu íntimo sente-se a mesma pessoa. É-o de facto, mas tal como portador de uma doença altamente contagiosa. Fernando é agora uma ruína, cujos pedaços se esboroaram. Apenas os pilares mestres e as padieiras das portas se mantêm de pé, inúteis.
Boa semana!
Garrido Carvalho
Setembro '09