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"o valor da ingenuidade" por almada negreiros

 
 
Pensamento/Reflexão
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O Valor da Ingenuidade
O maior perigo que corre o ingénuo: o de querer ser esperto. Tão ingénuo que cuida, coitado, de que alguma vez no mundo o conhecimento valeu mais do que a ingenuidade de cada um. A ingenuidade é o legítimo segredo de cada qual, é a sua verdadeira idade, é o seu próprio sentimento livre, é a alma do nosso corpo, é a própria luz de toda a nossa resistência moral.
Mas os ingénuos são os primeiros que ignoram a força criadora da ingenuidade, e na ânsia de crescer compram vantagens imediatas ao preço da sua própria ingenuidade.
Raríssimos foram e são os ingénuos que se comprometeram um dia para consigo próprios a não competir neste mundo senão consigo mesmos. A grande maioria dos ingénuos desanima logo de entrada e prefere tricher no jogo de honra, do mérito e do valor. São eles as próprias vítimas de si mesmos, os suicidas dos seus legítimos poetas, os grotescos espanatalhos da sua própria esperteza saloia.
Bem haja o povo que encontrou para o seu idioma esta denunciante expressão da pessoa que é vítima de si mesma: a esperteza saloia. A esperteza saloia representa bem a lição que sofre aquele que não confiou afinal em si mesmo, que desconfiou de si próprio, que se permitiu servir de malícia, a qual como toda a espécie de malícia não perdoa exactamente ao próprio que a foi buscar. Em português a malícia diz-se exactamente por estas palavras: esperteza saloia.

Parecendo tão insignificante, a malícia contudo fere a individualidade humana no mais profundo da integridade do próprio que a usa, porque o distrai da dignidade e da atenção que ele se deve a si mesmo, distrai-o do seu próprio caso pessoal, da sua simpatia ou repulsa, da sua bondade ou da sua maldade, legítimas ambas no seu segredo emocional.
Porque na ingenuidade tudo é de ordem emocional. Tudo. O que não acontece com as outras espécies de conhecimento onde tudo é de ordem intelectual. Na ordem intelectual é possível reatar um caminho que se rompeu. Na ordem emocional, uma vez roto o caminho, já nunca mais se encontrará sequer aquela ponta por onde se rompeu.
O conhecimento é exclusivamente de ordem emocional, embora também lhe sirvam todas as pontas da meada intelectual.

Almada Negreiros, in "Ensaios"


cruz mendes

 
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Alexis
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Enviado por Tópico
Caopoeta
Publicado: 10/09/2009 11:52  Atualizado: 10/09/2009 11:52
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 Re: "o valor da ingenuidade" por almada negreiros
..muito bem!

obrigado por partilhares este texto de Almada connosco.


beijo.


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 10/09/2009 13:11  Atualizado: 10/09/2009 13:11
 Re: "o valor da ingenuidade" por almada negreiros
Alexis,amei o texto,obrigada por compartilhar...sempre é bom refetir
Abraços
Mary


Enviado por Tópico
poesiadeneno
Publicado: 10/09/2009 18:50  Atualizado: 10/09/2009 18:50
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 Re: "o valor da ingenuidade" por almada negreiros
Li o texto e quase me sinto na obrigação de comentar para esclarecer o ponto fulcral do mesmo.
Almada diz:"O conhecimento é exclusivamente de ordem emocional, embora também lhe sirvam todas as pontas da meada intelectual."

Como é fácil de ver entra em contradição...se o conhecimento é "exclusivamente" emocional nada tem de intelectual"racional".Almada,todavia, diz que "pode servir-se do intelectual".

Não deve ser por acaso que quando perguntaram a Pessoa o que achava de Almada,aquele respondeu laconicamente:" que Almada não é um génio manifesta-se, em não se manifestar."
Isto não impediu porém de anos mais tarde o aceitar no seu grupo de amigos e não só.

Gosto da pintura e da poesia de Almada;quando se mete nos meandros da ciência estatela-se.
Será que não leu a Monadalogia de Leibniz, ou o Idiota de Dostoievski?


Beijo