Grito…
Grito porque se agitam as artérias em tons de revolta, porque te vais com o tempo nas ondas desta ausência que me sufoca e que arde por dentro… Grito porque se agitam as águas da falta que me fazes e se enfurecem em mim os dias mortos pela distância que nos separa. E grito, grito, grito… grito tanto… grito muito e doem-me as palavras que ainda me faltam escrever, doem-me as frases que a minha boca sela num momento de melodioso desassossego, num momento onde o único som que se escuta é que as ondas do mar fazem ao bater nas rochas…
Nas frinchas que se abriam por entre os pedaços de madeira que constituíam o passeio por onde os nossos pés desavergonhados e curiosos espreitavam poderia ver-se as pedras redondinhas, perfeitas, as pedras que o mar fez girar, rodar, bater umas contra as outras para as moldar, para as aperfeiçoar, para depois as despejar para um canto espalhando um pouco da sua beleza, para agora de vez em quando vir até elas e lhes lamber o rosto nesse gesto profundo repleto de saudade de quem não se vê à muito…
O mar que supremo se erguia tocando o horizonte com o seu manto azul, onde de quando em vez se viam pequenas embarcações de pescadores, pequenas a esta distância pois só Deus sabe o seu real tamanho, o mar que se erguia sublime e se despachava a espalhar o ser charme esbatendo-se contra as rochas, as rochas que se alegram com este toque molhado… respirar a maresia num trago de ar fresco que nos penetra a alma e nos ocupa os sentidos, sentir o cheiro do mar entrar-nos pelas narinas e percorrer o nosso corpo acompanhando o sangue a cada bater do nosso coração…
Grito… grito … grito no silêncio… grito o teu nome ás alturas deste amor puro que se ergue para lá de mim, para lá de ti… grito no silêncio e escuto o teu silêncio e num momento de êxtase ouço as palavras que não dizes e sinto-me em mim, abraçando-me a alma, tocando-me o coração…
Na brancura limpa de uma rosa sem espinhos entregas-me a alma, entregas-me o amor que em segundos de me extravia para um qualquer estado irreal, envolve-me o ar já gasto dos dias este bater descompassado do coração, e recebo-te já no clímax desta loucura que me enche os pulmões de ar, um ar renovado e fresco que apazigua o meu espírito e me devolve à terra de onde fugi, de onde me perdi com esta rosa entre os dedos gritando estas palavras exactas que o silêncio agora escreve.
“Cada um de nós é uma só palavra e toda a vida aprendemos a dizê-la”… Contigo aprendi a dizer amo-te com a boca repleta de amor para dar, amar é dar-se e dou-me a ti sem limites nem barreiras, sem excessos nem faltas, dou-me a ti por inteiro, nada te sobra, nada te falta porque sou tua na totalidade do meu ser, ser que se desprende de mim para em ti morar, ser que te preenche os sentidos e te corre pelas veias… e sou em ti, sou em ti o amanhã que nos espera juntos de mãos dadas, sou em ti nesse qualquer futuro que ambos iremos desregular, por onde caminharemos sem por os pés no chão levados pelas asas que o amor nos ofereceu.
Faltava-me eu que me sabia perdida por uma qualquer viela que nem os mapas conheciam, faltava-me eu antes de te conhecer, faltava-me eu e esta alma pura que de vez enquanto me visitava mas que raramente ficava… tu trouxeste-me o que eu sou e agora nada me falta… Tu vieste oferecer-me o meu “eu” sem pedir nada em troca, caminhas-te até mim comigo nos olhos, entregaste-me o que eu sou e ficas-te, ficas-te tu e fiquei eu e ficamos os dois num só…
Aconchego-me ao teu ombro, roço o meu braço no teu, olho o teu sorriso e sorrio também; ouço a tua mão percorrer os caminhos da minha, ao longe o mar arrepia-se ao observar a grandeza do sentimento que nos une… com medo bate feroz contra as rochas e recua… avança e recua… avança e recua… traz consigo gritos de amor atados nestas águas salgadas, traz consigo gritos que acompanham o meu grito de amor e se perdem em nós porque é em nós que se reflectem… nos teus olhos que agora observo eu vejo toda a paisagem, todo o horizonte azul que se perde por aí fora em sítios impensáveis e inacreditáveis, está em ti todo o meu horizonte…
Grito porque se desprende em pedaços este amor que te entrego puro, porque se agitam as pálpebras dos meus sonhos, porque me preenches a alma com este grito de amor que eu dou, porque este grito é meu e soa em ti, porque eu sou em ti e não sei ser demais nenhum modo…
Grito…
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. façam de conta que eu não estive cá .