Shershock e Whatson eram os dois detectives mais brilhantes da Cocaínolândia. Amigos inseparáveis, dedicavam a sua vida a inventar mistérios para depois os descobrir. Shershock era pequeno e impressionável, Whatson era um verdadeiro gentleguy cocaínolândico, cujo nome gostava de repetir vezes sem conta à mesa com a sua família.
Estes dois homens punham os pontos nas vírgulas. Gabavam-se de ser os mestres da sua nação, dois polícias, homens e empreendedores. Quando o crime decidia acalmar, passeavam-se pela sua fábrica Pó de Charrite Lda, cujos lucros eram divididos pelos dois sócios, e cujos dividendos eram fumados anualmente na reunião de accionistas, todas as semanas.
Resolveram os mais distintos casos, fumaram os mais distintos pós, encantaram as mais belas damas, mas um mistério permanecia. Há vários anos que o mercado surrealista estava dominado por um grupo desconhecido de presuntos malfeitores, que por sinal não faziam lombo nem chouriço, surrealizavam tudo ao limite, monopolizando o negócio que se quer livre por natureza.
Shershock, com as suas entradas chocantes, começou por ir à Sociedade Cocaínolândica de Surrealismo, procurando o gerente.
- Onde está esse malfeitor que destrói a liberdade do nosso povo, Sérgio? – perguntou o brilhante e brutalmente sensual detective.
- Olá patrão, o senhor que procura saiu para ir à procura de si mesmo, patrão.
Shershock, tentando entender o que aquele homem disse sem parecer muito estúpido ou até realista, agradeceu-lhe e respondeu que ia procurar pistas mais relevantes. Whatson, por seu lado, ficou no escritório, com a certeza que iria encontrar a resposta através de uma alucinação derivada do seu heróico brilhantismo.
No dia seguinte, pelas catorze da manhã (os fusos horários eram algo estranhos naquela nação soberana), Shershock rompeu a porta do escritório, gritando para o seu sócio:
- Achei os malfeitores, Whatson! São dois e um deles sou eu!
- Faz sentido, se eu já sabia que era eu, e eramos dois, o facto de ser meu sócio indica que a malfeitoria também era trabalho seu!
Como se uma multidão lá estivesse, saltaram os dois:
- Fantástico, Whatson!
- Fantástico, Shershock!
Dezassete segundos depois da eurofia própria de um anúncio de televendas, afundaram-se noutro mistério: se eles eram eles, não sabendo que eram eles, então como eram eles malfeitores, monopolizando algo que era seu sem saber?
Ao início, sacudiram os ombros como quem lava as mãos do assunto, mas depois olharam um para o outro, sorriram e saíram à rua com toda a confiança daquele mundo. Sabiam que eram brilhantes detectives, brilhantes homens e cavalheiros, e agora eram donos de um monopólio que só eles sabiam gerir. Mais ninguém sabia trabalhar naquilo, no belo país da Cocaínolândia, no belo país realista, no território mais desafortunado a oeste da Amiguinstantanlândia.