Todos esperavam na paragem pelo autocarro que fazia a ligação á praia da Figueirinha. Na rádio a noticia dava conta que o dia iria ser bastante quente.
Finalmente chegou o tão desejado autocarro. A confusão era tremenda. Todos queriam entrar á pressa com chapéus, geleiras e tudo o mais. O condutor era uma rapariga ainda muito nova. Após certificar-se pelo espelho retrovisor do lado direito que ninguém ficaria preso na porta de trás, fechou ambas as portas e deu assim inicio à marcha do autocarro.
Alguém no momento deu um grito. A condutora interrompeu a marcha do veiculo travando violentamente causando algum alarido aos mais distraídos. Era um rapaz de cerca de catorze anos que tinha ficado em terra. A condutora tinha já aberto a porta da frente do autocarro para o rapaz entrar.
-Então não entras? - Perguntou a jovem condutora
- Não tenho dinheiro para a passagem senhora ! Respondeu o gaiato de aspecto franzino e muito moreno.
A condutora franziu as sobrancelhas e respondeu o seguinte:
Deixa lá, não faz mal, eu pago-te a viagem - Respondeu a rapariga mexendo num dos bolsos das suas calças. Os passageiros que iam no banco junto ao condutor, um casal de meia-idade, apreciaram positivamente o gesto da rapariga. Mas ao contrário dessa observação, houve quem não gostasse e até repudiasse o acto.
Tratava-se de um pequeno grupo de amigos de escola que pareciam ser do contra. Logo tratou de se juntar a eles um casal de nariz bastante arrebitado que insistentemente elevavam os dois braços no ar em tom de ameaça como a querer dizer que estavam atrasados tudo por causa daquele puto mal vestido e desajeitado. Porque haveria o autocarro de parar por causa daquela criatura? Tudo voltou á normalidade e se acalmou quando o autocarro começou a circular.
As lindas paisagens que avistavam pelas janelas do autocarro deixaram todos rendidos. O azul do rio Sado era deslumbrante mesmo quando já não se via e dava lugar ao outro azul. O do Oceano Atlântico. O forte do Outão, hoje convertido em hospital Ortopédico para tratar de ossos, estava já à vista. Isto significava que a praia da Figueirinha estava já muito próxima e logo ali na descida.
No dia seguinte, estava de novo mais um dia espectacular para ir á praia. O verão estava na sua máxima força. Na paragem do autocarro para a Figueirinha, estavam quase praticamente todas as caras que estiveram no dia anterior. O casal provocador e o mesmo grupo de estudantes. Por ironia do destino, o rapazinho de ar franzino também ali estava.
Um condutor decidira parar o seu bruto Mercedes mesmo na paragem do autocarro. Parecia ter aspecto de alguém muito importante pois apresentava-se todo janota vestido num belo fato de seda. Eis que surge o autocarro e dá uma forte buzinadela de advertência ao condutor que ignorava o código da estrada. O senhor do Mercedes dirige-se então ao condutor do autocarro que por sinal é a mesma condutora que tivera feito a mesma carreira um dia antes e cumprimentou-a.
Todos presenciavam aquela cena para se inteirarem do que realmente se estaria a passar. O tal senhor não era nada mais, nada menos do que o pai do rapaz franzino, que estava a restituir à condutora o dinheiro que esta tivera pago ao seu filho, pela sua deslocação á praia. Algumas pessoas comentaram que aquela atitude do pai do rapaz deveria ser digna de tal registo, pois nos tempos de hoje é muito raro ver-se alguém com aquela educação e consideração.
E assim acaba este meu conto, deixando á vossa consideração o que vos oferecer dizer ou comentar sobre o assunto.•
Gabriel Reis