Parte I
O encontro era improvável, apesar de combinado. Três mulheres reunidas, distintas, quase divergentes. Maria, não acha o seu nome triste, apenas algo infeliz. Talvez simples em demasia. Maria, receia o efeito de um nome quase simplório, na imagem de mulher moderna e sofisticada que bem sabe projectar. Eventualmente, um nome musical como o da rapariga à sua frente, que acabara de conhecer. Matilde. Um nome bonito, sem dúvida um nome com personalidade, pensa, no meio da conversa de circunstância de quem se acaba de conhecer. Discretamente, olha de alto a baixo a robustez de um corpo bem delineado e forte. Um pouco mais alta que ela, talvez dez anos mais jovem, mas com um aspecto antigo, de quem não faz umas compras hà muito tempo. Maria imagina o impacto de uns pequenos retoques. Uma cor no cabelo, a emoldurar os olhos, salientando-os. As unhas, limpas e bem aparadas, transformadas em longas, com brilho rosa velho ou forte. Uma mudança total no guarda-roupa, para peças de corte simples, justas, luminosas, e com um cachecol de seda a esvoaçar. E os sapatos, sobretudo arrumar definitivamente no lixo, aqueles sapatos apagados pelas molhas dos Invernos. Então, calçar um par bem elegante, não muito alto, em cor a gosto, a combinar com a das unhas, e uma carteira pequena da mesma colecção.
Matilde, admirava os preparos de Maria, mas sem exagero nem inveja. Quem para si olhar, vê por fora o que é por dentro, e isso agrada-lhe. O espírito prático e objectivo, impedem-na de ir além de uns cremes hidratantes, aplicados na pele branca irregularmente. Há nela uma franqueza a roçar a inocência e pouca ambição. Define sempre metas dentro do concretizável, quer nas tarefas do dia-a-dia quer nos sonhos da vida. Imagina e define cada etapa, cada pormenor daquilo a que se propõe. Depois, conjuga tudo com a rotina, com a família e amigos. Matilde, tem orgulho de ser metódica e fiável, sabendo que o seu destino será sempre um um trilho seguro e racional. Essa sensação cómoda, atormenta-a por vezes. Uma tristeza vinda de onde não sabe, preenche-lhe o peito. Sente-se confinada, quase claustrofóbica, frustrada com a falta de algo novo e ousado. Lembra-se de uma vez, com a Maricéu e outros amigos da Universidade, ficar a observá-los divertirem-se numa praia deserta, completamente nus. Foi de surpresa. Não sentiu à-vontade de correr na praia, rindo, sentindo o vento no corpo, sentindo a força de ousar e improvisar um atalho no seu caminho.
(Continua...)
Boa semana!
Garrido Carvalho
Julho '09