Esta é a segunda parte de um total de cinco
O céu fechou-se de repente. A mulher sentada na varanda observava os primeiros pingos da chuva que começava a cair. A poeira da piçarra levantava-se, o cheiro forte de terra molhada penetrava em seus pulmões. Fez-se nó. Os olhos arderam.
É o telefone que toca. Corre, a chuva nessa época é mal agouro.
Era.
Já é tempestade. O peito arfa, o coração bate desesperado. Poços de lama na rua. A chuva volta a ficar calma. Ameniza o vendaval. Uma tímida trovoada aqui, acolá.
Meninos, muitos moleques! Brincam nas biqueiras das casas, na lama da rua, pulam de alegria na enxurrada.
A enxurrada carrega o lixo das calçadas, os meninos descalços. Há risco de contágio.
Seu pranto é como a enxurrada, mas não carrega, não leva consigo a dor, o pesar que se apossa d’alma. Está escuro, a luz faltou. A chuva permanece tímida. Faróis distantes, vão aos poucos se aproximando. Pára em frente á sua casa. Desce um homem já de idade e uma menina adolescente. Os olhos da mulher estão inchados. Ela pisca, deixa cair uma lágrima.
O vento balança violentamente as folhagens as folhagens. Como se dissesse “Vão embora!” Eles não foram.
__ Sinto muito minha querida.
É como se pedisse o contrário. Raios cortam o céu, trovoadas incessantes. A mulher cai no chão da varanda.
__ Papai!
O homem junta-se a ela.
__ Ele não quis vir. Por que ele não quis vir? Abandonou-me, ele foi cruel, prometeu voltar!
O vento frio, carregado de chuva invadia a varanda.
__ Pare! Vá embora! Quero morrer também, me deixe afogar!
__ Não fale assim.__ pede a menina, chorando.
Os soluços sacudiam o corpo, a última frase, ele se foi com aquela última frase. Era verdade? “Ama-o mais que a mim.”. Não, não era verdade.
__ Vamos para casa.
Estava escuro, o vazio não era total porque ainda existia uma tempestade lá fora. Mas sem luz, nem na rua, nem na casa.
__ Vão vocês, eu fico.__ De repente ficou serena.
__ Mas...
Não teve jeito. O carro afastou-se. A chuva continuou. Entrou na casa acendeu uma lamparina. Tudo vazio. A poltrona não estava ocupada, a estante arrumada__ fato inédito naquela hora do dia.
A pancada do vento na janela.
__ Fique quieto!
O retrato na mesinha. O sorriso era triste. Triste seria ela dali para a frente. Lembrou-se do balanço na mangueira.
Foi ao quintal correndo. Lá estava. Ninguém o balançava, nem mesmo o vento. Sentou-se nele, balançou-se. Sua roupa completamente molhada. Onde, onde ele estará? Por que não vem? Não é tarde, ainda é tempo. Tempo para recomeçar? E se a chuva não parar? E se o vento não voltar a soprar? Derreter, desaparecer. Ser levada pela enxurrada, ser carregada pelo vento feito folha seca.
Desmanchar-se. Virar chuva. Não era preciso. Já era. Eternamente chuva seria. O céu continuaria cinzento, a temperatura baixa, a pele arrepiada de frio e medo.
E os meninos continuavam a brincar, fazia tempo que não chovia! Era ele que chorava? No céu? Era Deus? Ele já havia chorado assim, e um dia parou. Mas agora, era diferente, não era o mundo, era ela. A luz voltou.
Do quintal via a lama afogando as mudas recentemente plantadas. Apodreceriam. Os galhos da roseira estavam quebrados. A roseira que ele mesmo plantou, também morreu. Todos se foram com ele. Ela também queria ir.
__ Volta pra mim...
O vento começou a silvar, era diferente.
__ Você está aqui?
A última rosa sã despetalou-se. A chuva caia, dessa vez mais forte.
Apenas uma pessoa que usa a literatura e o cinema para fugir desse mundo cão. Escrever é apenas um ato e exercício de liberdade!