Sinto o peso brutal do meu mundo nos ombros, empurrando, forçando, ferindo o meu corpo. As pernas que começam a ceder, lentamente a revelar toda uma dor exteriorizada apenas num sorriso, mas denunciado pelo suor que escorre sem parar, desgastando a pele, ardendo nas feridas abertas, amolecendo as crostas das marcas recentes, suavizando as cicatrizes mais antigas. Nada sou senão, mais uma face perdida nesta vasta multidão que se cruza em caminhos separados, onde ninguém vê o tombar, muito menos o esboçar de um sorriso de dor, quando nestes meandros da vida, não por falta de visão os cegos procuram caminhos em labirintos complexos, com entradas e saídas, dando voltas, andando para frente, para trás, em círculos estonteantes para quem vê, encontrões, empurrões, gritos mudos desconexos mas sempre numa busca incessante, constante ...
Caminhando simplesmente numa inocente esperança de encontrar um sorriso compatível, uma forma de energia semelhante, algum, qualquer, mesmo que indisponível, com quem possa partilhar nem que seja por um segundo, libertar um pouco da dor do peso que me faz cambalear que acumula em pequenas explosões neste meu mundo de solidão, de louca solidão. E este peso que continua a aumentar exponencialmente forçando agora a um caminho estático, e eu já de joelho no chão marcando o movimento tentando suportar, esfolo-me vivo para resistir aos efeitos de um todo. Mas enquanto não tiver forças nada posso eu fazer senão aguardar pacientemente pelo momento certo seja ele qual for. E aos poucos destapa-se um véu onde me vejo num acumular de vidas passadas que deixaram marcas profundas na minha mente bem intencionada, mas que não conseguiu esquecer tudo o que está para trás, como se de uma incapacidade frustrante se tratasse, ou de um talvez querer morrer e não poder, justificando interiormente aquele ter morrido sem viver.
Mas este peso que não sai que não pára de crescer obriga-me agora a pousar as mãos neste chão cheio de espinhos, força-me a ceder, mas nada disto é suficiente para me conseguir derrotar pois tenho uma alma persistente e sei que o meu penar neste mundo ainda não terminou. Sem saber muito bem como ou porquê no mais fundo do meu ser descubro que interiormente uma nova força imponente nascia, feita de vontade de vencer, forjada de uma necessidade de explodir, de me conseguir libertar de todos o pensamentos que me atormentam com o ter sofrido sem amar, de todas as memórias em mim se arrastam do ter amado em sofrimento. Ainda existem muitos a quem deitar a mão, ajudar, partilhar, abanar, e ao tomar esta consciência vejo que toda dor que suporto, todo o peso que sinto e que é apenas meu em nada se compara com o que existe neste mundo de caídos, perdidos na imensidão da própria alma.
Blackbirds like small priests walked in the silent fields.
[ wilderaven @ lusopoemas ]