Paulo Monteiro (*)
A publicação de Enciclopédia do Futebol Gaúcho – Volume I – Ídolos e Craques, de Marco Antonio Damian e César Freitas, com lançamento no próximo dia 16 de julho na sede da Academia Passo-Fundense de Letras, revelará ao público um dos acontecimentos editoriais mais importantes da Capital Nacional da Literatura neste ano de 2009. Revela, ao mesmo tempo, Marco Antonio Damian um dicionarista que continua a tradição iniciada por nosso confrade Antonio Carlos Machado com sua Enciclopédia Sul-Rio-Grandense Ilustrada, publicada em fascículos, pela Gráfica Editora Berthier, de Passo Fundo, entre 1988 e 1989.
Não sei se o autor de Futebol de Passo Fundo – Contribuição à sua História conhece O Pampa Heróico (Esbôço geral da sociogênese riograndense), Rio de Janeiro, 1942, s/ed., mas há uma coincidência de idéias incríveis entre a Introdução do livro do Antônio, que já nos deixou e Apresentação do outro Antonio, que é um membro atuante de nossa Academia. Refiro-me à notícia-crime do descaso que havia para com os documentos referentes à história do Rio Grande do Sul, feita pelo autor de Seara Alheia, há 65 anos, e o que escrevem Marco Antonio Damian e César Freitas, quando ao descaso existente nos clubes rio-grandenses do sul, quanto à documentação interna.
Trata-se de uma tradição ancestral. Talvez preserve a herança das hordas selvagens, apagando os rastros para que não fossem seguidas por tribos adversárias, ou dos bandos armados que fizeram “o Pampa heróico”, decantado em prosa e verso, também para ocultarem seus objetivos táticos dos antagonistas, ou, ainda, para não deixarem provas das degolas e outras violências. Quaisquer que sejam os motivos dessa destruição das fontes históricas, Antonio Carlos Machado, a seu tempo, e Marco Antonio Damian, hoje, não se amedrontaram, conseguindo realizar obras imorredouras.
Mas entremos na essência mesma deste primeiro volume da Enciclopédia do Futebol Gaúcho.
Numa carta de Paris, dirigida a Gaspar da Silveira Martins, em 7 de abril de 1896, o Barão do Rio Branco narra que às 3 horas daquele dia, aconteceria última partida entre “os melhores jogadores de Paris e o Club de Coventry, que possui uma das mais célebres turmas de futebol da Inglaterra”. Revela, com certo orgulho, que seu “filho Paulo, estudante de medicina, é o arrière ou back da equipe francesa e é tido como o melhor arrière da França”. Traduzindo, historicamente, nos últimos anos do Século XIX o melhor zagueiro da França era um brasileiro. Não era, porém um dos nossos muitos afro-descentes, nascidos e crescidos nas periferias, mas um integrante da nobreza imperial. O futuro consolidador das fronteiras nacionais sentencia: “Esse gênero de esporte devia ser introduzido no seu Rio Grande do Sul, em Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Minas, onde o clima permite tais exercícios”. Quem revela esse documento é Lafayete Silveira Martins Rodrigues Pereira, à página 48 da Introdução aos Discursos Parlamentares de Silveira Martins, publicados pela Câmara dos Deputados em 1979.
Os aproximadamente 1500 verbetes enfeixados nesse tomo inicial da Enciclopédia do Futebol Gaúcho comprovam o acerto de Rio Branco. No Rio Grande do Sul de Silveira Martins nasceram ou se destacaram muitos dos mais importantes atletas brasileiros e firmaram-se duas das “célebres turmas de futebol” do Brasil em todos os tempos, Internacional e Grêmio. Certo é que poucos anos depois das proféticas palavras de Rio Branco, maristas franceses introduziam o “esporte bretão” em Passo Fundo. Ao que tudo indica a atual Praça Tamandaré, ao redor da qual nasceu a cidade nos dias finais de 1827 e onde acamparam exércitos farroupilhas e caramurus e tropas maragatas e pica-paus foi nosso primeiro “estádio”.
Marco Antonio Damian e César Freitas, com essa obra, resgatam uma dívida histórica dos gaúchos com seus ídolos e preservam seus nomes para as gerações futuras. Ali encontramos os grandes ídolos e os quase anônimos jogadores que fizeram e continuam fazendo a alegria dos torcedores nos quatro cantos do Rio Grande. Ler a Enciclopédia do Futebol Gaúcho é recordar craques que se tornaram ídolos e que fizeram, no Estado, a alegria e a tristeza de colorados e gremistas, ou de quatorzianos e periquitos, em Passo Fundo.
Apoiada em vasta e demorada pesquisa, que incluiu até mesmo pacientes investigações em cemitérios, para conferir datas de falecimento de atletas, o livro que será lançado na sede da Academia Passo-Fundense de Letras, será um clássico.
(*) Paulo Monteiro, autor de livros e centenas de artigos e ensaios sobre temas literários, culturais e históricos, é presidente da Academia Passo-Fundense de Letras e integra diversas entidades culturais do Brasil e do Exterior.
poeta brasileiro da geração do mimeógrafo pertence a diversas entidades culturais do brasil e do exterior estudioso de história é autor de centenas de artigos e ensaios sobre temas culturais literários e históricos