Esta é a minha opinião, não uma verdade incontornável, mas a minha própria verdade, aquela que aprendi ao longo do tempo, à custa de erros, de muitas leituras, da própria experiência, dos outros que fazem parte da minha vida. Enfim, fica aqui, desta vez não uma definição do amor, mas o que ele não é. Este texto teve origem nas conversas que tenho tido nos últimos tempos com grandes amigas minhas, como a Naly, a Vera e a Catarina, mas acho que foi escrito sobretudo para a Vera, e ela de certo perceberá o porquê.
O amor não é um filme de 2h com happy ending, são mais que horas, dias e meses, quando se fala de amor fala-se em anos, afinal nem uma vida é suficiente para conhecer alguém a 100%, quanto mais… O amor não é para todos, são poucos que conhecem o seu estado puro, conhecem sim paixões a que dão o nome de amor, banalizando o verbo amar. O amor não é só sexo, dizem que os homens chegam ao amor através do sexo e as mulheres chegam ao sexo através do amor, talvez assim o seja em certa medida, mas então que chamar àqueles romances épicos de esperas intermináveis que não chegaram nem perto de ser consumados? Existem tantos tipos de amor, amor de pais, de irmãos, de amigos, seria um ritual um pouco estranho os homens terem relações sexuais com todas essas pessoas não? O amor tem efeitos diferentes de pessoa para pessoa, há quem demore anos a descobrir o sentimento, de tão calmo e medido que pode ser, claro está que há quem sinta aquelas terríveis borboletas no estômago, mas geralmente nesses casos existe é uma perfeita conjunção entre amor e paixão, afinal a chama da paixão não é eterna ao contrário do amor. O amor não é para ser enjaulado num relacionamento ao leve início de um sentimento, há todo um jogo de descoberta que tem que ser feito previamente, e claro que é aí que o destino tem lugar. Não percebo porque limitam o amor às linhas de uma relação quando este ainda nem é digno do nome, talvez seja desespero, pura parvoíce, necessidade de ter alguém ao lado, solidão, ou porque pior que isso, não se apercebem do erro que cometem e se acham incríveis românticos por arriscarem. Românticos? Homicidas do amor. Todas essas obras literárias falam-nos de longas esperas, são capítulos e capítulos de amores que sobreviveram a tudo e a todos para além de qualquer razão lógica, que acima de tudo ultrapassaram obstáculos. Onde estão as dificuldades de uma relação que nasce e se celebra do acaso? A expressão “o meu amor é o meu melhor amigo”, não poderia ter mais fundamento, há que confiar, conhecer o outro, ver o que mais ninguém vê, ler o olhar, falar no silêncio, saber sentindo com o coração. O amor não é mel, há que discutir, ser honestos acima de tudo, e saber que por mais que se diga tudo vai ficar bem. O amor não se encomenda e bate à porta dias depois. O amor não é um reles produto nas prateleiras do supermercado, e nem por sombras o homem mais rico do mundo consegue comprá-lo. Aqueles que enjaulam o amor, pouco ou nada sabem sobre ele, vivem enganados, esmagados pelo hábito, conformados com o que pensam que têm dentro da dita gaiola. Nas ruas, jardins zoológicos ambulantes em toda a parte, passeiam com orgulho essa espécie de animal exótico a que chamam de amor ao seu lado, orgulhosos de o dominarem e possuírem, metem-lhe é trela curta, não vá virar selvagem e fugir. Ora a natureza é muito parecida com o amor, imprevisível. Os animais que nascem em cativeiro ali querem ficar, pois mais nada conhecem, essa espécie de “amor” dos nossos dias também é assim, acomoda-se às quatro paredes de uma relação, mas é então que o inesperado acontece, esse processo inexplicável, uma quase doença, uma recusa a esse meio criado, e sem razão aparente o animal torna-se selvagem, voltando-se muitas vezes contra o domador, louco por essa raiva, essa sede de liberdade, essa natureza, pois sem saber bem porquê o instinto diz-lhe que não é aquele o seu lugar. O amor não se prende para não fugir, pois é ainda mais imprevisível que um animal, porque na verdade o único amor existe é o que nasce em liberdade, apesar das inúmeras experiências ainda não há amor de cativeiro, tudo isso são subgéneros, rascunhos de um original, pois é nas possibilidades que se têm e se optam por não se seguirem que reside a consciência desse sentimento. O amor não nasce numa jaula, por muito que se pense que sim, a própria tendência no desejar o que não temos é contrária à criação de tal monstruosidade, esse amor artificial. O ser humano é muito mais complicado que os animais irracionais, e o simples pensamento, a simples tentação, são a chave de todas as jaulas, acelerando o processo de doença, lutando por liberdade. Quem prende o que não tem, nada terá no fim, apenas um monte de mentiras em que costumavam acreditar. Em pleno século XXI este processo tornou-se bem mais fácil, hoje já quase ninguém fica onde não quer, nem se contenta com pouco, às excepções resta-lhes ter esperança de ter essa coragem de deixar para trás o que não lhes serve. Claro que apesar de todas as facilidades, o libertar pode demorar anos, ou pode ser parcial, como uma procura exterior ao mundo por detrás dessa pedra, sem nunca realmente a abandonar. O amor não é a base da amizade, a amizade é que é a base do amor, até porque é lógico que ninguém chega à meta antes de começar a correr. O amor não é usar palavras, é senti-las em todos os gestos sem necessitar de as dizer, não são alianças, nem papéis, é muito mais do que se vê e se toca. O amor não é fácil, até porque tudo o que se conquista sem luta depressa perde o encanto. Existe amor à primeira vista? Não propriamente, mas existe um momento de clareza em que sabemos que estamos perante alguém que nos poderá acompanhar por tais íngremes caminhos. O amor é uma eterna lei de retorno, seguindo também as leis da natureza, já dizia Lavoisier que na natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma.