Quando de vosso vôo contente,
Admirava do céu a tristeza,
vislumbrei um balé de beleza,
Onde dançavas solitariamente.
Quietei-me, ausentando-me de mim!
Ouvi calado o vosso canto!
Cá me perdia em casto pranto,
ao ver tão majestoso querubim.
Deixar-me-ia morrer no enxergar,
pois de beleza o mundo há suprido,
(já que nenhum protesto fora ouvido)
só por estar no céu a bailar.
Dançaste por dias, e encantei-me!
Bebi das pávidas noites serenas!
Comi da terra as luas pequenas;
Dormir solitário, e mirrei-me.
Ao bramir do sol, deleitei-me,
Com a alvura do céu a brilhar;
Do pássaro o canto fiz copiar,
e, sem medo ao céu, entreguei-me.
Estando lá o pássaro fiz encontrar;
apaixonado por teu canto de prece,
raptei-lho para que comigo fizesse
da terra o mais sublimável par.
Afastei-lho de seu ninho alado;
Aprisionado, já não mais cantava;
enquanto minha pobre dor aumentava,
Chorava aos cantos desafinado.
Libertar-nos-ia no libertar;
Qual canto de glória ao céu,
que corre o horizonte infiel,
e sente, mas não pode escutar.
Fi-lo da terra o ser mais infeliz;
Já que nem de tristeza cantava;
não sorria, não comia, não piava!
tampouco haveria de ser joliz.
O lindo querubim as asas pendeu,
e com elas se foram o doce canto!
Das pétalas celestes ficou pranto
de uma sina de silêncio sandeu.
Quando o perecimento já abatia,
um sopro do céu veio a libertar,
e às almas muito enfermas curar,
do mal que há muito lhes curtia.
Da prisão o querubim se libertou;
Verteu-se no céu e pôs-se a cantar,
reanimou-se-lhe e dançou no luar
enquanto piava, como jamais piou!
Eu cá em terra pus-me a chorar,
duma alegria e tristeza do canto,
e calado vislumbrei, com espanto,
que só ali ele teria seu lar.
E ele, nas noites frias de solidão,
quando colhe o céu a tristeza,
canta alegremente à nobre realeza,
sua terna e lisonjeira realização.
Enquanto fico eu perdido em terra,
ouvindo calado a linda serenata
do pássaro à noite ingrata,
que solitária e muda se encerra.