Vem do fundo do tempo
como que da profundidade duma face que envelhece
mas fica sempre com uma esperança nova na alma
esta vontade férrea de perguntar
o que é o homem, senão um bicho sem asas
que rasteja eternamente quando se recusa a gritar?
O que é o homem quando prefere o culto do trivial
e se contenta com míseras missas apologéticas
com que o fazem calar?
O que é o homem quando não vai ao fundo
dos acontecimentos
e se borra todo como as crianças
com medo de se enganar?
O que é o homem quando lhe batem os pés
como fazem aos gatos e o fazem fugir
para a sombra e nela permanecer
de face escondida a tremer?
O que é o homem quando se cala e se acomoda
às ideias que lhe vendem
e às promessas que lhe fazem para o impedir
de dizer?
Um homem assim não é coisa nenhuma!...
É apenas uma coisa qualquer sem vontade
um ingénuo, um fogo-fátuo, um bota-de-elástico
um berda-merda de homem
porque nem sequer chega a ser
uma merda de homem qualquer.
Publicado no Jornal "Rostos"