Dai-me uma folha, que seja, uma só folha seca,
ao menos, para escrever.
Eu quero escrever as coisas inconcretas
que saem desta minha sã loucura misturada
com laivos de furibunda melancolia.
Quero imaginar outro mundo, um mundo novo
com malmequeres coloridos,
que apaguem do mapa, duma vez por todas
este mundo actual em guerra envolvido.
Oh ironia!
Oh madrugadas vindas duma longa noite,
ímpia noite, secreta e tenebrosa noite
que tarda tanto em fazer-se claro dia.
Passeio pelas varandas interiores da alma
e verifico que trago em mim as imagens
da limpidez da água que tanta guerra teima
em turvar e fazer lama.
Rios de sangue rubro como a rosa rubra
que já murcha exangue,
teimam em fazer murchar o meu poema.
Mas o meu poema há-de ser grande!
E, como uma espada levantada
quero que o gume aponte para novas formas
de pensar a humanidade e dê a um mundo novo
um novo rumo e um mais próspero e lindo horizonte.
E é desse novo mundo onde só floresça o trevo
de quatro folhas orvalhado
no odor do malmequer campestre
que eu hei-de compor poemas com mãos de mestre.
E com um nome sonante. Sim!
Porque eu quero para esses novos poemas
usar um nome sonante.
Um nome que vá para além de mim.
Para além do meu.
Não quero um nome como este tão simples, assim…
quero um nome sem ser nome de cédula de baptismo
com um som sonoro diferente do meu
para que todos fiquem a saber que quem escreveu
esses versos não fui eu mas outro para além de mim
o outro meu eu
como se o meu nome fosse os degraus na terra
e o outro eu os anéis que prende a Terra ao Céu.
Publicado no Jornal "Rostos"
e no Recanto das Letras em 06/08/2007
Código do texto: T594691
de "do Meu Grito sufocado"