Contos : 

Cowboy

 
Deixei a vida com a sensação errada de ter acabado de sair duma sala de cinema de bairro, onde o filme pode ser muito bom mas onde a decrepitude da sala...o odor a mofo, o mau ambiente...dão cabo de tudo! Os ingleses têm bom nome para isso: "bad surroundings". É isso, essa chusma, o cheiro a bafio que nos deixa atordoados.
Entrei no cemitério já batiam as onze. Ainda se sentia uma neblina de fim-de-manhã no ar e o som comprido e afiado dos carris do eléctrico transportou-me até ao jazigo. Prazeres, nunca percebera o nome deste cemitério, pensei, enquanto apagava uma beata na pedra calcária frente à porta de ferro fundido. Olhei para o interior através da grade da porta: três caixões já ocupavam três das quatro prateleiras disponíveis, que a família não era rica. Não gostei do que vi. Tinha tempo. Deitei fora o maço, percorri calmamente o caminho até ao "piolho", entrei na sala escura e tacteei o caminho até à fila H, lugar 15. Quando me sentava, o palhaço do índio lançou-se em vôo, gritando enquanto aterrava sobre a faca do John Wayne, acocorado na amurada da caravana. Acordei com o grito e jurei para mim mesmo que nunca mais frequentaria sessões da meia-noite, sobretudo depois de morto.

 
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voronov
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