Sou de olhares, confesso. Sobre os olhares, com olhar em frente, real ou virtual. Intrinsecamente. De preferência, verdes, com fundo moreno! Ou negros! Mas não desdenho nenhum olhar que me faça perder, se for intenso. Gosto de janelas enormes, mesmo as da alma.
Gosto do azul. Primus inter pares. Seja céu ou mar. Ou estandarte de emoções.
Mas também gosto que componham as minhas cores, ao sabor das utopias, e de alguns mistérios.
Já fui de cinzentos. Pretos e brancos. Separados ou misturados, em miscigenação. Tenho atrás de mim uma história de ausências. De partidas. De dores intensas e imensas. De espadas do tempo ceifando as minhas vidas, as úteis e as dos afectos. Avós, pais, tutores, tudo essa espada levou na madrugada da vida. Por isso, o cinzento da saudade irreversível. Incontida. O reavivar dos rostos que não voltam mais, mas estão em carne viva, aqui, cá dentro, misturados com lágrimas.
Mas sou de tonalidades quentes! O vermelho da paixão, do amor, esses fogos que ardem sem se ver.
Mas sou de tons frios. Indiferente e de indiferenças.
Sou branco, de facto e intencionalmente. Porque assumo as imperfeições do olhar. Se o olhar fosse perfeito, nunca veríamos o arco-íris num aglomerado de gotas transparentes, trespassadas pela luz solar. Porque a transparência é incolor.
Se o meu olhar fosse perfeito, a experiência da Física, que demonstra que todas as cores em movimento circular nos dão a ilusão de branco, seria um fracasso. Porque continuaríamos a ver todas as cores, a rodarem, imensas, e não esse círculo branco, uniforme.
Talvez por isso, goste do mistério. Talvez por isso, tenha de cerrar os olhos à luz intensa. Talvez por isso o pôr-do-sol seja a matriz da beleza incondicional. Talvez por isso, como todos os amantes, sonhe com a primeira madrugada, o primeiro sol a nascer, em mantas, no banco da frente de um “carocha”, à espera do Nescafé com “I can see cleary now”, em fundo.
Mas nunca terei visto todas as cores. Sou insatisfeito, quererei, sempre, o novo. Cores novas, intensidades novas nos sentimentos. E o “desejo de provar novas cores” será sempre um hino à intensidade e a esta ânsia humana de chegar à perfeição, sabendo que ela é impossível. Porque, se fosse possível, saberia onde está e não a perderia tão amiúde.
Gosto da imagem da paleta de cores, colorindo o branco intenso. Essa assunção de que persigo o infinito no finito da mente, com os olhos infinitos dos sonhos. Desenhando quimeras em fundo de ficção.
Mas estarei, sempre, mais perto da perfeição, se for capaz de fechar os olhos, determinadamente, e conseguir ver, com os olhos de dentro, a grandeza perseguida. Porque só sinto, de facto, de olhos fechados. E a verdadeira química é transcendente. Quase metafísica.