Ao Excelentíssimo Ministro da Agricultura
Exposição
Porque julgamos digna de registo
a nossa exposição, senhor Ministro,
erguemos até vós, humildemente,
uma toada uníssona e plangente
em que evitamos o menor deslize
e em que damos a razão da nossa crise.
Senhor! Em vão esta província inteira
desmoita, lavra, atalha a sementeira,
suando até à fralda da camisa.
Falta a matéria orgânica precisa
na terra, que é delgada e sempre fraca.
— A matéria em questão chama-se… Caca.
Precisamos de merda, senhor Soisa!
E nunca precisámos de outra coisa.
Se os membros desse ilustre Ministério
querem tomar o nosso caso a sério,
se é nobre o sentimento que os anima
mandem cagar-nos toda a gente em cima
dos maninhos torrões de cada herdade.
E mijem-nos também por Caridade!
O senhor Oliveira Salazar
quando tiver vontade de cagar
venha até nós!... Solícito, calado,
busque um terreno que estiver lavrado
e, como Presidente do Concelho,
queira espremer-se até ficar vermelho!
A Nação confiou-lhe os seus destinos?
Então comprima, aperte os intestinos.
Se lhe falhar um traque, não se importe,
quem sabe se cheirá-lo nos dá sorte?
Quantos porão as suas esperanças
num traque do Ministro das Finanças?
E quem viver aflito, sem recursos
já não distingue os traques…dos discursos.
Não precisa falar! Tenha a certeza
que a nossa maior fonte de riqueza,
desde as grandes herdades, às courelas
provém da merda que juntarmos nelas.
Precisamos de merda senhor Soisa!
E nunca precisámos de outra coisa.
Adubos de potassa?...Cal?...Azote?!?...
Tragam-nos merda pura do bispote!
E todos os penicos Portugueses
durante, pelo menos, uns seis meses.
Sobre o montado, sobre a terra campa,
continuamente nos despejem trampa.
Terras alentejanas, terras nuas,
desespero de arados e charruas,
quem as compre ou arrenda ou quem as herda
sente a paixão nostálgica da merda.
Precisamos de merda senhor Soisa!
E nunca precisámos de outra coisa.
Ah!... Merda grossa e fina! Merda boa
das inúteis retretes de Lisboa!...
Como é triste saber que todos vós
andais cagando sem pensar em nós!
Se querem fomentar a agricultura
mandem vir muita gente com soltura.
Nós daremos o trigo em larga escala,
pois até no faz de conta a merda rala.
Venham todas as merdas à vontade,
não faremos questão de qualidade.
Formas normais ou formas esquisitas!
E desde o cagalhão, às caganitas,
desde a pequena pôia, à grande bosta,
de tudo o que vier a gente gosta.
Precisamos de merda senhor Soisa!
E nunca precisámos de outra coisa.
Évora, 18 de Fevereiro de 1934
Pela Junta Cooperativa dos Sindicatos Reunidos
Do Norte, Centro e Sul do Alentejo
O Presidente,
Don Tancredo (o Lavrador).