Sopra-me a brisa no rosto; no aconchegar do casaco ao corpo, é como se me aninhasse em mim mesmo; a brisa traz o teu cheiro, maresia pura, que dá para fechar os olhos e imaginar todas as marés que deram a esta praia..., inunda-la de corsários e piratas, com seus barris de rum, com cânticos desafinados e caneca na mão; soa até o troar dos canhões, das sangrentas batalhas travadas ao largo! Cheira a pólvora! Ouvem-se os gritos!... Tudo o que a brisa traz e me deixa no colo, num simples fechar de olhos. Vim aqui, à Praia do Cão perdido; é bonita, já não vinha cá há algum tempo, fica perto, mesmo ao virar da alma; na linha ténue do horizonte, não sei onde termina o mar e começa o céu, mas é algures por ali, naquele ponto onde o sol, faz mais uma das suas exuberantes despedidas, hoje, manchada por uma pequena nuvem, que teima em não passar, é como se, tivesse presa ao próprio astro rei; virei me para trás, num gesto intuitivo e vislubrei a lua que se aproximava, esguia e em passos mui tímidos; trajava de brilho mágico, encantador,... não fôra o mar meu eterno confidente e eu teria cometido a loucura, de perder toda a timidez e meter com ela dois dedos de conversa; voltei a olhar para o sol, estava mesmo de partida, mas apesar disso, a pequena nuvem ainda o manchava... juntei então os meus sentidos e percebi, que havia uma tristeza no ar, o rei e a rainha, que apenas se veêm à distância, como se fora dois amantes num proibido amor aprisionado, seria a nuvem o amor chorado?... Não sei, talvez; do sol, apenas resta a cor das labaredas longínquas, o mar que ardia, está a ficar escurecido, não poderei ficar muito mais tempo, mas sei, que logo, vestir-se-à de prata cintilante e soltará as ondas, para poderem dançar com os peixes. Sussurra-me a brisa o Teu nome. É bonita, a praia do Cão perdido; não vi viv'alma desde que cheguei aqui; já fui até à beira mar, trocar sorrisos com as conchas, afagar as ondas e contar as pegadas das gaivotas. O mar está calmo, ondular sereno, apaziguador. A brisa beija-me o rosto com lábios de maresia, sinto como se fossem os Teus! ...Talvez por isso, os meus lábios cantem sal. Afinal, vou esperar pela lua, ousarei ficar mais um pouco. Vou ficar aqui sentado na areia, desta praia fantástica, onde um dia, eu perdi o cão que não tinha. A brisa... levou-me a alma pela mão.