Poemas : 

POEMAS DIVERSOS

 


Quando eu nasci a minha mãe morria
com uma santidade de alma em pena.
Seu corpo era translúcido.Ela tinha
sob sua carne um luminar de estrelas.
Morreu. Mas eu nasci.
Por isso levo

um invisível rio em minhas veias,
um invencível canto de crepúsculo
que me estimula o riso e mo congela.
Ela ajuntou á vida que nascia
o estéril ramalhar de vida enferma.
A palidez das mãos de moribunda
amarelou em mim a lua cheia.

Por isso, irmão, está tão triste o campo
atrás dessas
vidraças transparentes...
... Esta lua amarela em minha vida
faz com que eu seja um abrolhar da morte...

Pablo Neruda in O Rio Invisível
Poesia e prosa de juventude
Tradução: Rolando Roque da Silva
DIFEL, São Paulo,1982

15

Me gustas cuando callas porque estás como ausente,
y me oyes desde lejos, y mi voz no te toca.
Parece que los ,ojos se te hubieran volado
y parece que un beso te cerrara la boca.

Como todas las cosas están llenas de mi alma,
emerges de las cosas llena del alma mía.
Mariposa de sueño, te pareces a mi alma,
y te pareces a la palabra melancolía.

Me gustas cuando callas y estás como distante.
Y estás como quejándote, mariposa en arrullo.
Y me oyes desde lejos, y mi voz no te alcanza.
Déjame que me calle con el silencio tuyo.

Déjame que te hable también con tu silencio
claro como una lámpara, simple como un anillo.
Eres como la noche, callada y constelada.
Tu silencio es de estrella, tan lejano y sencillo.


Me gustas cuando callas porque estás como ausente.
Distante y dolorosa como si hubieras muerto.
Una palabra entonces, una sonrisa bastan.
Y estoy alegre, alegre de que no sea cierto.

15

Gosto quando te calas porque estás como ausente
e me escutas de longe; minha voz não te toca.
É como se tivessem esses teus olhos voado,
como se houvesse um beijo lacrado a tua boca.

Como as coisas estão repletas de minha alma,
repleta de minha alma, das coisas te irradias.
Borboleta de sonho, és igual à minha alma,
e te assemelhas à palavra melancolia.

Gosto quando te calas e estás como distante.
Como se te queixasses, borboleta em arrulho.
E me escutas de longe. Minha voz não te alcança.
Deixa-me que me cale com teu silêncio puro.

Deixa-me que te fale também com. teu silêncio
claro qual uma lâmpada, simples como um anel.
Tu és igual a noite, calada e constelada.
Teu silêncio é de estrela, tão remoto e singelo.

Gosto quando te calas porque estás como ausente.
Distante e triste como se tivesses morrido.
Uma palavra então e um s6 sorriso bastam.
E estou alegre, alegre por não ter sido isso.

Pablo Neruda in 20 Poemas de Amor e uma canção desesperada
Tradução :Domingos Carvalho da Silva
José Olímpio Editora- RJ -1974

XIII

Cresce o homem com tudo que cresce
e se acrescenta Pedro com seu rio,
com a árvore que sobe sem falar
por isso minha palavra cresce
e cresce:
vem daquele silêncio com raízes,
dos dias do trigo,
daqueles germes intransferíveis,
da água extensa,
do sol cerrado sem seu consentimento,
dos cavalos suando na chuva.


XVIII

Os dias não se descartam nem se somam, são abelhas
que arderam de doçura ou enfureceram
o aguilhão: o certame continua,
vão e vêm as viagens do mel à dor.
Não, não se desfia a rede dos anos: não há rede.
Não caem gota a gota de um rio: não há rio.
O sonho não divide a vida em duas metades,
nem a ação, nem o silêncio, nem a virtude:
a vida foi como uma pedra, um só movimento,
uma única fogueira que reverberou na folhagem,
uma.flecha, uma só, lenta ou ativa, um metal
que subiu e desceu queimando‑se em teus ossos.


Pablo Neruda in Ainda
Tradução:Olga Savary
José Olympio Editora – RJ-1978


XXXVII


OH AMOR, oh raio louco e ameaça purpúrea,
me visitas e sobes por tua viçosa escada
o castelo que o tempo coroou de neblinas,
as pálidas paredes do coração fechado.

Ninguém saberá que foi a delicadeza
construindo cristais duros como cidades
e que o sangue abria túneis inditosos
sem que sua monarquia derrubasse o inverno.

Por isso, amor, tua boca, teu pé, tua luz, tuas pernas,
foram o patrimônio da vida, os dons
sagrados da chuva, da natureza

que recebe e levanta a gravidez do grão,
a tempestade secreta do vinho nas cantinas,
a chama do cereal no solo.

Pablo Neruda in Cem Sonetos de Amor
Tradução de Carlos Nejar
L&PM Editores –Porto Alegre-RS –1979


Em Pleno Mês de Junho

Em pleno mês de Junho
me aconteceu uma mulher,
melhor uma laranja.
Está confuso o panorama
Bateram à porta
era uma lufada,
um látego de luz,
uma tartaruga ultravioleta,
a via com lentidão de telescópio,
como se fosse ou habitasse
esta vestidura de estrela,
e por erro do astrônomo
houvesse entrado em minha casa.

Todos

Eu talvez eu não sei, talvez não pude,
não fui, não vi, não estou:
― que é isto? E em que Junho, em que madeira
cresci até agora, continuarei crescendo?

Não cresci, não cresci, segui morrendo?

Eu repeti nas portas
o som do mar,
dos sinos,
eu perguntei por mim, com encantamento
(com ansiedade mais tarde),
com chocalho, com água,
com doçura,
sempre chegava tarde.
Já estava longe minha anterioridade,
já não me respondia eu a mim mesmo,
eu me havia ido muitas vezes.

Eu fui à próxima casa,
à próxima mulher,
a todas as partes
a perguntar por mim, por ti, por todos
e onde eu estava já não estavam,
tudo estava vazio
porque simplesmente não era hoje,
era amanhã.

Porque buscar em vão
em cada porta em que não existiremos
porque não chegamos ainda?

Assim foi como soube
que eu era exatamente como tu
e como todo mundo.

Pablo Neruda in Últimos poemas
(O Mar e os Sinos) - 1973
Tradução: Luiz de Miranda
L&PM ditores –Editado no Brasil 1983 -RS


Pablo Neruda
( 12/07/1904 — 23/09/1973)
Autores Clássicos no Luso-Poemas

 
Autor
Pablo Neruda
 
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Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 15/04/2009 12:05  Atualizado: 15/04/2009 12:05
 Re: POEMAS DIVERSOS
Com a devida vénia pelo autor desta página acrescento um breve apontamento biográfico.

Biografia (Wikipédia)

Pablo Neruda nasceu em Parral, em 12 de junho de 1904, como Ricardo Eliezer Neftalí Reyes Basoalto. Era filho de José del Carmen Reyes Morales, um operário ferroviário, e de Rosa Basoalto Opazo, professora primária, morta quando Neruda tinha apenas um mês de vida. Ainda adolescente adotou o pseudônimo de Pablo Neruda (inspirado no escritor checo Jan Neruda), que utilizaria durante toda a vida, tornando-se seu nome legal, após ação de modificação do nome civil.