Era um salão velho. Quase tão velho como a mais velha das pessoas no salão. Quase tão velho como a cobardia que o ergueu.
De tão velho que está treme-lhe o chão e as paredes ao som da música. Ao som daquela música que ecoa nas paredes velhas e trémulas do salão. Daquela música que não se ouve, mas que contagia toda a gente. Por ela todos dançam…
Todos dançam a mesma dança, não podem sequer dançar outra, mas cada um dança para uma direcção diferente, no mesmo salão de todos, a mesma dança de todos…
É nesse salão que estou perdido, afastado num canto, a olhar de olhos bem abertos todos eles que dançam à minha volta. E eles dançam de olhos fechados.
Todos têm máscaras. Máscaras de baile, de baile de máscaras, máscaras brancas ou pretas, máscaras brancas e pretas, máscaras tristes e alegres, ou tristes, ou alegres, máscaras de ouro, máscaras de jóias, máscaras de madeira, máscaras valiosas, máscaras simples, máscaras de todas as tonalidades de cinzento, máscaras de todas as formas e feitios… Mas todas máscaras.
No meio de todas procuro também saber da minha, então levo as mãos à cara e dirijo-me a um espelho escondido, já que todos os outros bailarinos do salão, embora se enxerguem claramente, são espelhos alterados, de forma a que se alguém abrir os olhos se vê a si mesmo da maneira como mais se deseja ver. Esse pequeno espelho, inútil para os outros, mostra a minha face nua.
Detenho-me então no salão. Todos dançam menos eu, assim como a máscara que não tenho é única entre todos. Todos dançam aquela música que outrora foi ouvida por mim, que outrora foi dançada por mim, mas que por força da minha loucura foi esquecida.
Esqueci a música que já não ouço e a dança que já não danço.
Olhando em meu redor percebo que já não tenho nada a fazer neste baile de máscaras. Ainda tento desesperadamente abrir os olhos a alguns dos mascarados mas eles não me conhecem sem máscara, por isso empurram-me, com medo, antes de observarem novamente o salão pelos espelhos e tornarem a fechar os olhos.
Acabo rapidamente por desistir de tentar mostrar algo que ninguém quer ver, de tentar dar o dom da visão a quem é cego por opção, então dirijo-me para o imponente pórtico que me leva à saída deste baile de máscaras, empurro a pesada e maciça madeira e abraço o exterior.
Lá dentro nem se apercebem de que algo aconteceu. Não se apercebem do milagre que ocorreu quando alguém perdeu a sua máscara.
O salão continuará perfeito aos seus olhos.
A música continuará a ser ouvida e a dança continuará a ser dançada.
Emanuel Madalena