Ignoro quem dorme ali ao lado
paredes meias comigo, no sonho.
Noite dentro. Penso. E perco-me de mim
neste enredo. E encontro-me em mim.
E revejo o missal do meu passado.
Luzes. As luzes agora apagadas.
As armas desengatilhadas.
Que sossego e que paz!
Os jardins….
Os jardins dos sonhos despedaçados
onde se debruçam guitarras do fado
sem cordas nem carrilhões, partidas.
O espectador, um homem…
Um homem sisudo, parado no tempo
vestido de negro, ancorado
neste Cais sem Cais de abrigo.
Em redor desse homem, tudo negro.
Nada já é colorido.
Nada já é iluminado.
Neste homem,
a boca de raiva arreganhada ri irónica do sonho
que teve. Sonho que não realizou.
O cabelo branco, revoltado, sangra inquietações
ainda por viver. Que as vividas escoaram o peito
de tanto sangue verter.
Neste homem, cúpulas erguidas de igrejas de fé
perdida, caíram de sono, cansadas
de não convencer.
Chagas, mil chagas abertas, lâmpadas acesas,
outras tantas mil fundidas…
Vida apagada… palavras por dizer.
Inquietações. Ossos, veias, artérias…
Para quê este sangue todo
(tanto sangue derramado!)
nestas vidas humanas que amanhã ou depois
acabam por morrer?!
Perturbam-me estas galerias da vida!
do Autor in "O Livro das Inquietações"