Estou inteira dentro de mim, estou guardada do mundo...
fecho as portas, baixo as vidraças, cerro as cortinas,
não tenho passado nem futuro, sou meu próprio tempo,
minha pele está marcada por ventos e gotas de orvalho
que colhi ainda há pouco, na madrugada, em busca de aconchego.
Meu corpo tem memória de outro, mas a alma resta intacta,
as mãos que me tocaram, os olhos que me olharam
não foram além da superfície de mim...
(e eu nem queria um grande amor, pudera!)
Minha boca esta cerrada mas não rígida,
apenas muda e ensimesmada
e o corpo resta quieto,
sangue indo e vindo
e estou assim qual planta morta ainda na semente,
quando sei que minhas possibilidades restam
guardadas nas horas não vividas
e murcharam em dias de promessas distantes!
E assim guardada em mim mesma estou a salvo
das agruras da vida,
mas estou só.
Envolta pela velha casca da semente que não
germinou,
permaneço possibilidade impossível,
futuro abortado,
promessa não cumprida,
carta extraviada...
Estou guardada em mim mesma
e choro:
orvalho que escorre por folhas
endurecidas nas intempéries,
vertentes cujas águas jorram
por trilhas antigas,
chuvas caindo dos telhados da infância...
... o consolo das lágrimas clareando
a escuridão das dores do mundo...