(quando a morte me levar não ergam bandeiras negras.
encham sim os copos com vinho;
mas cuidado que a Gula azeda a garganta!)
Ó FASCINADOS Produtores de Lixívia!
Será que um dia da vossa produção dará para desinfectar o mundo?
Então dois dias
Que venham lá três! Três dias sem sair de casa
Três hipóteses para sobreviver
Três terços de manhã à tarde e à noite
Esta mosquitada vai toda de uma vez!
O estudante precisa de um canudo
E eu preciso de um canudo para bater no estudante
Aprender é aqui
De A a Z nas estantes
Como o borrachão nas adegas
A teoria não muda a fralda a ninguém
Não foi preciso esperar pela luz
Eu nunca me borrei!
Sou auto-suficiente
Na tropa toquei clarim e mandei o exército regressar
Elogiaram-me o pescoço
Que daria para bom laço
Disseram
A sorte é que tenho amigos corruptos
E num empurrão elevaram-me a mártir
Os heróis só aparecem nas estreias
A mim espetaram-me com bíblias na mão
Para vender de porta a porta
Na primeira porta que bati beijaram-me os pés
Só porque eu tinha cabelos compridos e as vestes compridas
Mudei de marca de cigarros
Os intelectuais souberam logo!
Eu cá sou de mudanças
Vou ao Paulista porque posso ficar a dever
E tem boas entradas
Demitido sou noutras ruas
Um dia engoli uma bola de queijo
E ninguém me deu valor
Toquei Bach com os dedos metidos na boca
E fizeram-me olhos negros
A inteligência não sai na bica da fonte
Acreditem! Eu já tentei!
Meu cérebro gorduroso apostou tudo numa rixa
Se disser que ganhei minto
O maior pecado é não pecar e ver os outros pecar
O maior cemitério é o que está a um palmo acima das nossas cabeças
Ou talvez menos
Lindas paisagens!
Lindos azulejos!
Lindos seios que aquela mulher tem!
O eco ecoa sempre que a ponte me tenta
Não!
Não vou acender o isqueiro quando houver fuga de gás!
Não vou a Roma só porque dizem que lá a fé é mais barata!
Aprendi a andar de bicicleta tarde
Mas olhem como eu pedalo! Faço curvas
Contra-curvas
Tiro as mãos do volante
Sabia que é tudo uma questão de sistemas emparelhados?
Domino papagaios como nunca dominei uma mulher
Fico para ali horas a vê-lo voar
E eu na terra
A trocar os fios da corrente eléctrica a ver no que dá
A ganância já se vende nas bancas
Os jornais falarão de mim quando não houver massacres
Manifestações
Vítimas violadas
Santos roubados
Congressos de pívias
Estarei eu
Diante e exposto
A dar sangue aos cabeçalhos
A dar cursos de divergências
A tomar o lado do contraditório
E tudo: ah! Que lindas são as paisagens maciças!
Os ventos nem conseguem mexer uma folha!
Nada fecunde
Nada transmite ao Outro o que o Outro disse
Nada mais vai parar aos museus
Toda a História será revista por bisontes
As clínicas a tornarem-se casas de passe
Nada será mais Ontem
O Futuro tem a data do século anterior
Nos blocos operatórios joga-se à bisca
Quem mexer na minha cabeça terá de responder!
E aviso que tenho amigos maus
Fazem truques de maldade
Mastigam livros inteiros do Saramago em vez de chiclete!
A minha missão é pôr fim aos fingimentos
Tenho um mindinho que detecta tudo
Quem se mexer está a levar!
Os meus lábios estão inclinados para a morte
Mas não me empurrem!
A minha única moral é ser contra os moralistas
Tenho uma mulher que me abre o lençol
Prepara-me o lanche e regressa ao mar
O mito há-de ser mitigado
Colocado na batedeira a mil rotações
Não julguem que eu não amo
Amo! Amo os glaciares que estão derretendo
Amo os ombros do homem que carrega
Amo a liga da mulher oferecida
Amo o espectáculo dos amantes
Amo o pecador à saída da igreja
Amo a plasticidade com que me beijam!
Ó noites fartas ó noites vadias!
Tomai meu pulso enquanto bate
O elixir já se esgotou
Restas-me tu ó mesa dos condenados!
Ó licenciada em vampirismo!
Verifica-me o sal antes de beijar a pedra
Esta pedra que aqui vês a servir de janela
Tenho pena que não haja árvores para subir
Era puto e lembro-me que subia subia subia
Agora
Que a tísica sede me toma
Fico aqui
Na escrivaninha do tempo
No silêncio intemporal
Coleccionando raridades
Lançando beijos às moças das fábricas.