Hoje, vou solto em meu canto
Catar meu ponto sem notas
Levantar do meu duro chão
O corpo de um resto sem notas
Que desatina, alucina e me faz viver
Hoje, vou ao canto manso
Cantar essa dor em meus versos
Com a boca que o tempo molda
Fazer da vida o sangue que já é terra
Matar a fé na fome que já é guerra
Ontem, andei procurando a velha solidão
Encontrei filhos dormindo em cada canto
De cada goteira vivida corria um pranto
Em cada olho aguardente secava mágoa
De cada peito cortante brotava água
Hoje, na dobras do tempo
Retiro do mundo embotado
Seu bolso cheirando a terra
No peito um lírio rasgado
Fecundado no ventre do tempo
Terra que nunca foi minha
Quero ver o mundo mudado
Mudar a sorte da minha dor
Nesse fim partido e cantado
não ter faca , nem corte no peito
Nem levar a cicatriz do leito
Não ter tempo p'ra temer o medo
Nem ter medo p'ra temer a dor ...
José Veríssimo