Se acaso interessasse, teriam visto seus olho, assustadores eclipses de onde a vida partira.Olhos, onde antes se hospedavam cupidos, agora um pântano derramando visões tantas, segredos, belezas e torpezas piedade do próprio estado de abandono. Perceberia o vento sem forças sequer para encrespar a maré pequena, oriunda de uma única gota de sangue esfomeado de vida devolvida gota a gota, átomo a átomo, ao grande incógnito vazio do Universo, que já não era necessário penetrar em seus pulmões ? O ar não se agita o mar permanece imóvel translúcido sem ondas, sem movimento, um grande lago sem vida, tanto vale a tumba quanto o regaço materno.
Não haverão de conhecer neste rosto pálido cerâmico os caminhos tortuosos esculpidos pela mão invisível e implacável do tempo.
Nada disto acontecerá nem a visão da felicidade alheia confortadora, nem a visão perturbadora da cólera alheia, nem a visão molhada de amores perdidos. Neste tumulo em que se transformara, ninguém se irrita, ninguém sorri, ninguém se mostra, o ódio não é permitido não é permitido sofrer além desta esperança desprovida de metas sem energia, este tédio sem fim.
O universo infalível da ostentação tecido no seu cérebro putrefava solitário nos seus sonhos dispersos, e estas luzes pálidas rotas que encharcavam úmidas e prateadas seu corpo abandonado, nada revelavam ou distinguiam. Todo o resto eram ofensas, emoções para este corpo nascido e morto da noite do destino.
Carlos Said